A molecada de hoje é bastante esperta, até demais eu diria. Eu lembro que com 11 anos eu ainda não sabia que um filho era gerado por uma relação sexual. Sério. Claro que eu sabia que homens e mulheres se relacionavam sexualmente, ainda que não fizesse uma ideia clara de como isto se dava, mas que um filho era resultado disto só fui aprender um pouco mais tarde. Tem um fato pitoresco que gosto de lembrar, minha mãe tinha uma amiga (ela faleceu faz tempo) da qual eu gostava muito, era muito carinhosa comigo, o caso é que no seu segundo parto ela teve um AVC que comprometeu os movimentos das mãos e cegou-a de um olho. Certa noite ouvi minha mãe comentar com meu pai que um médico havia dito a tal amiga que se ela tivesse um outro filho poderia ser fatal. Temi por ela, achava que um outro filho seria certeiro simplesmente por ela estar casada. Coisa doida, né? Ou eu era muito bocó ou éramos todos muito puros a 40 anos atrás.
Claro que os meios de comunicação de massa ajudaram muito a tornar nossas crianças precoces, então parte da pureza tão necessária ao infante acaba ficando perdida.
Quando garoto, descíamos as ladeiras com carrinhos de rolimã e não raro nos esfolávamos nas inevitáveis quedas. Quantos hoje na faixa dos 40, 50 anos não tem suas cicatrizes nos joelhos por conta de tombos de bicicleta? A petizada hoje só falta andar de bike trajando um escafandro. Nada contra proteger as crianças do que poderia ser um acidente feio, até fatal, mas, sei lá, me parece que toda esta proteção não tem valido muita coisa.
Em Pirituba, eu e uns amigos gostávamos de brincar de Tarzan. Subíamos em árvores, pulávamos dos galhos para o chão, nos digladiávamos numa boa nos barrancos de terra fofa ou campinhos de areia. Um detalhe curioso é que ninguém queria ser bandido, como só havia um homem macaco, o restante tinha que se contentar em ser um personagem menos famoso. Então ficávamos assim, o Tarzan geralmente era o menino que era dono do quintal, um tipinho esperto, o mais baixinho dentre nós, com trava de língua, soberbo toda vida. O seguinte acabava sendo o Korak, que era filho do Tarzan, por sugestão minha, eu era o único que lia gibis, os demais conheciam o rei das selvas pelo seriado protagonizado pelo Ron Ely. O engraçado é que o Korak era bem maior que o Tarzan, seu pai. Eu acabava sendo o Targo, personagem cujo primeiro roteiro foi criado por Francisco de Assís e desenhado por Moacir Rodrigues para a Editora Taika na década de 60. Ainda sobrava um garoto, o mais molenga e chorão, como não sobrou um herói para ele viver, inventei o Targot, jurando de pés juntos que era o mais forte e mais famoso de todos só pro cara não chorar, ele, pouco convencido acabou aceitando, afinal não tinha muita escolha. A gente brincava a tarde toda, criando nossos roteiros, tínhamos que salvar a Jane, geralmente uma mulher invisível, como invisíveis eram os nativos perigosos da Africa, os socos e pontapés eram desferidos no vento com sonoplastia criadas por nossas bocas. Os leões e jacarés imaginários também não eram poupados. Foram tardes gostosas, só acabando quando nossas mães nos chamavam pra tomar banho e jantar.
Jogávamos bolinhas de gude e todas essas coisas, eu só não curtia muito soltar papagaio (empinar pipa, como é mais popular no Rio) por não ter o menor domínio da coisa. Aquele foi o único momento da minha vida onde estive confortável em um grupo com mais de quatro. Foi breve, mas lembrando hoje parece que foram anos de diversão.
Não brincávamos apenas disso não, tinha a novela "Cavalo de Aço", as corridas de Fórmula 1 onde o Emerson Fittipaldi era a grande sensação com suas costeletas enormes. Eu era fã de Rivellino, Gerson e Tostão, embora nunca fosse amante de futebol.
Hoje os meninos crescem em frente à televisão ou computador, com jogos cada vez mais realistas sobre um marginal bombado de camiseta branca que espanca velhos e crianças pra cumprir sei lá que raio de missão. Não, não culpo os games, as HQs ou os filmes pela atual onda de violência, mas acho triste que esta situação seja banalizada desta maneira.
Nem sei se o homem hoje está mais inteligente de fato. Eu o vejo mais arrogante, só isto.
Apreciei muito sua forma de compor esta postagem. Relembrei também minha infância.
ResponderExcluirCordial abraço e muita paz interior!
Já estou seguindo-te
=D
Caramba! Eduardo, você narrou minha infância, kkkk!! Tá tudo aí, até a pouca intimidade com pipas, o meu irmnaõ caçula chorão...kkk. Bem legal recordar tudo isso. Que pena que hoje a garotada nem sabe o que perdeu... Talvez só nós saibamos. Parece papo de velho, e talvez seja mesmo. Mas vale a recordação.
ResponderExcluirAbração,
Ah! Eu tenho essa do Korak, da Ebal...
ResponderExcluirPaz pra você também Milton e obrigado pelo prestígio.
ResponderExcluirForte abraço.
Salve, Gilberto.
ResponderExcluirRapaz, é legal mesmo recordar o passado, li recentemente que é uma forma segura de viajar no tempo (palavras de um físico e filosofo respeitado), pena que meu tempo anda curto, eu queria descrever como brincávamos de pilotos de fórmula 1. Quem sabe outro dia.
Sim, eu conhecia o Korak das bancas, na verdade nunca li um gibi dele, é bom? O motivo era que muita coisa eu não tinha $$$ pra comprar, morria de vontade.
Papo de velho? Com certeza.
Isso é ruim? De jeito nenhum.
Abraços quebra-costelas, meu amigo.