Sempre tive muita admiração pelos artistas de rua. Sério. No Rio ou em São Paulo eu sempre perdia um tempinho pra ver os lutadores pularem através de uma roda de bicicleta cheias de facas ou rolos de arame farpado; tinha um tiozinho que pregava o Evangelho de Jesus no Largo São Bento (SP) equilibrado numa cordinha mequetrefe.
Certa vez no Largo da Carioca (RJ), um grupo de capoeiristas faziam uma exibição, a turma que assistia jogava uns trocados, os caras davam um salto mortal para trás e pegavam o dinheiro com a boca plantando bananeira, até que um deles, sei lá, talvez com os braços já cansados da proeza, caiu de boca no chão arrebentando os dentes, se vê de tudo numa situação assim.
Perto da Praça da República (SP) um trio de crianças negras (duas meninas, uma na guitarra, outra no baixo e um gurizinho na bateria) faziam um rock´n roll maneiro, executando na boa o hit Stand By Me popularizado pelo John Lennon; tempos depois vi essas crianças tocando no programa do Gugu.
Agora o que dizer dos artistas que fazem retratos e caricaturas na rua? Andando pelas avenidas do centro velho de São Paulo, tipo, Avenida Ipiranga, Rua 24 de Maio e outras, era muito comum ver aqueles caras retratando quem se dispunha a pagar o preço pra levar seu rosto feito a lápis ou carvão para casa. Certo, nem todos eram tão bons, mas só o esforço e cara de pau de alguns já merecem crédito.
Houve uma época na minha vida que eu estava completamente quebrado de grana, não tinha nem um real pra comer um churrasco grego na Avenida São João, pensei seriamente em me aventurar fazendo retratos nas praças, só não me arrisquei por que também não tinha cavalete, nem folha, nem carvão. E também porque sempre morri de vergonha de desenhar com pessoas me observando. Uma vez uma pessoa me disse que meu estilo realista de pintura seria bem recebida na Europa. Lá, segundo ela, artistas compunham suas telas pintando nas calçadas, o Velho Continente respirava arte. "Será mesmo?" Pensava eu.
Relembrando isto agora, me veio à mente um período muito tenso em casa, em que eu sem emprego, recebia recortes de jornal do meu pai quase todas as manhãs, coisas como balconista de lanchonete e atendente de não sei o quê, cheguei a responder a alguns daqueles anúncios, mas as vagas estavam preenchidas. Eu me sentia um merda. Meu pai devia estar muito ansioso pra se ver livre de mim naquela época, ele propôs me mandar pra França com passagem só de ida. A ideia era comprar uma passagem a prestação, eu destacaria algumas telas das armações, coisas que tinha pintado anos antes e colocaria num cone pra não ocupar espaço, uma vez lá eu poderia vende-las e ir me mantendo enquanto produzia novos trabalhos e assim sucessivamente. Um plano perfeito, enfim. Visto, passaporte e outros detalhes pareciam não ter importância. Eu nunca pude dizer não, e nem me atrevia, só que a coisa era sempre falada mas nunca levada a cabo. Eu já sabia por artistas que moravam na França, Espanha e Suíça, que não era nada fácil se destacar sem ter um lugar para morar. Mas eu estava disposto a tentar, nem que fosse pra morrer de fome e de frio, era melhor que a imagem de vagabundo que sempre me acompanhou. Sinto esse estigma até hoje.
Atualmente, ao caminhar por Recife vejo uns caras nas calçadas exibindo retratos de Elvis, Madona, Roberto Carlos e outros, alguns muito bem feitos e me pergunto se não estão passando pelos mesmos momentos complicados que passei um dia. Como nada posso fazer, mentalmente peço que Deus ajude esses artistas de rua a vencerem na profissão, sei que muitos não escolheram este caminho, foram escolhidos.
Este retrato que fiz a carvão foi para explicar a técnica passo a passo, este e outros exemplos devem estar chegando nas bancas em breve.
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Verdade, Eduardo. Essa profissão nos escolhe. Para o bem ou para o mal, kkk. E assim seguimos pela vida, metade dela tentando aprender a desenhar e a outra metade tentando ganhar dinheiro com o que aprendemos... Triste, mas real.
ResponderExcluirMesmo assim, gosto da sensação de saber o que quero desde cedo. Muita gente passa a vida sem saber o que será quando supostamente "crescer"... Nós ao menos já sabemos que a luta será dura.
Tenha um ótimo final de semana, você e sua esposa Verônica.
Abração,
E que luta dura meu amigo!
ResponderExcluirMas apesar de tudo, amo o que faço, estou sempre reclamando mas não trocaria isto por nada. Parece até que os clientes sabem disto e se aproveitam pra complicar. É a vida.
Grato amigo e um abraço.