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domingo, 15 de maio de 2022

A VELHA HISTÓRIA.

 A gente sempre pensa no dia de amanhã e deixa de viver o hoje, ninguém está livre dessa cadeia. Penso que isto se deva - no meu caso pelo menos - que um momento bom, sendo ele tão raro (de novo, no meu caso) queremos perpetuá-lo. O temor de que o amanhã, as horas seguintes sejam de desditas, nos faz agarrar com unhas e dentes os instantes de bem aventurança. Por que digo isto? Hoje tenho trabalho, graças ao bom DEUS, e se nada der errado, o projeto se estende até março ou abril de 2023. E depois? Bom, depois, não sei. Eu tento deixar para me ocupar quando o prazo estiver próximo, afinal o Mestre Jesus nos aconselhou a não nos amofinarmos com o porvir, isso de nada resolve. O fato é que eu gostaria muito de uma aposentadoria, um salário digno, seguro, para poder não ter a cabeça tão cheia de preocupações. Me dar ao luxo de depois de anos a fio trabalhando de manhã, tarde, noites e madrugadas em lugares apertados, em ambientes frios (São Paulo) e quentes (Jaboatão), poder relaxar um pouco e caminhar a esmo, ver o por do sol, ler meus livros, dormir sem o peso das pressões. Lembro das conduções lotadas com minha enorme pasta de desenhos indo à editoras para ver se conseguia um  trabalho, pegando dois ônibus e um metrô, seja no sol ou na chuva e na maioria das vezes retornava de mãos vazias. Hoje, num certo aspecto isso mudou um pouco, sou procurado para gerar arte mas a um preço baixo, quando não querem desenhos de graça. 

As centenas de ilustrações que fiz para os clássicos da literatura brasileira continuam chamando a atenção. Recentemente recebi mensagem de umas moças bem simpáticas, que trabalham na televisão, pedindo permissão para exibir algumas artes num especial da TV Cultura sobre a Semana de Arte Moderna. Respondi que por mim tudo bem, mas a Editora Construir podia não concordar, já que é ela que tem os direitos. A editora concordou e todos ficaram felizes. Só que ninguém quer pagar para ter um desenho inédito, exclusivo. Claro, vai ter meu nome nos créditos e isso equivale ao velho tapinha nas costas e o elogio: "cara, você é um gênio!" O ego infla, mas os estômago continua vazio.  Na mesma semana uma outra moça, agora de uma editora, pediu para usar umas artes que fiz para o Dom Casmurro num livro de literatura. Aconteceu o mesmo, aprovei e a editora também. Propus à moça, fazer uma arte nova, ela falou que não tinham verba. É a velha história sempre repetida.        

O salário que recebo atualmente vem da Editora Ciranda Cultural para a qual crio HQs sobre os Mitos Gregos e não cobre todas as minhas despesas, sempre fica um ou dois boletos em aberto que sempre pago depois com juros e isso acaba sendo uma bola de neve. Paralelo aos Mitos, tenho que continuar os outros dois quadrinhos em que trabalho com roteiristas distintos e pelos quais já fui pago. Estes, procuro fazer nos intervalos. 

Isso me impede de procurar trampo extra pra ajudar nas despesas. Pedi a um bom amigo para colocar umas artes originais de super heróis no Ebay mas até agora ninguém deu bola. 

Recebo muitos convites para participar de antologias de quadrinhos, sempre tem umas propostas legais, mas hoje não posso mais me dar ao luxo de trabalhar sem a certeza de um retorno financeiro. Foram muitos anos desenvolvendo um estilo de arte, algo que pudesse falar por mim. Desenhava como um possesso, para mim mesmo, como queria e achava que devia, sempre tentando encontrar o tom certo (nunca consegui, que fique bem claro), eu tentei comunicar a minha visão de mundo através dos quadrinhos mais que tudo e depois de uns sete livros na praça vejo que não fui muito longe, embora os mais otimistas digam que fui muito além. Bem, talvez, eu sou muito exigente com o que faço, acho que ainda há muito o que ser melhorado mas hoje não resta muito tempo para tanto.

Era o que eu tinha para dizer hoje. 

Alguns dos clássicos citados neste post.


6 comentários:

  1. Gostaria de perguntar para você e os futuros amigos que irão comentar aqui. A arte realmente pode nos retirar o luto de nós de uma forma definitiva? O processo da escrita e criação é maravilhoso, porém após o lançamento, além de não me sentir valor algum, sinto que o buraco no peito apenas me consome mais ainda. Fico escrevendo com a esperança do retorno "dela" ou alguma salvadora imaginária se materializar em um corpo próximo, porém a arte apenas me conforta no momento de sua criação, nunca após ser entregue ao público e seu julgamento.

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    1. Boa noite, Raul!
      Pergunta difícil de responder, ou talvez não tão difícil assim, baseado em algumas experiências. No meu caso, a arte funciona como um lenitivo para minhas dores, é minha única porta para escapar da realidade. No entanto, ela não tem o poder de mudar o que somos, algumas pessoas são vocacionadas à felicidade, ou seja, sofrem suas tragédias e não muito tempo depois seguem em frente buscando a superação; outros, como eu, não tem esse poder por mais que se tente. Entretanto essa condição não seria de se lamentar, penso eu. Li uma entrevista com o escritor peruano Mario Vargas Llosa onde ele dizia que a maioria dos seus pares faziam análise, mas não ele, pois suas desditas serviam de combustível para sua escrita. Num dos trechos da biografia em quadrinhos sobre o pintor Caravaggio feita pelo desenhista italiano Milo Manara, o biografado diz que "pintar é mais sofrimento que alegria".
      Não sei se isto responde sua indagação, mas se eu não tivesse passado pela pior decepção amorosa de minha vida, o Zé Gatão não teria sido criado. Sei que, cantar, pintar, escrever prosa ou poesia é como um barco que te ajuda a atravessar um rio de dores, mas não te livra do sofrimento.
      Isto posto, declaro sem medo de errar, que em Jesus Cristo encontramos alívio para o pior fardo, em meus momentos crônicos de depressão é em meus joelhos que eu clamo por socorro e a vitória é certa.

      Força e siga em frente com sua arte.

      (Obs. Como vê, só você comentou dessa vez, este blog anda com baixa frequência, mas registro assim mesmo minhas impressões frente à vida).

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  2. Boa tarde Eduardo, suas contemplações a cerca do "tapinha nas costas não enche barriga" me fez voltar ao começo dos anos 90, quando recém formado no colégio técnico de eletrônica depois de três longos anos cursando disciplinas técnicas pela manhã e o segundo grau no período vespertino (saia de casa 5:30h e voltava 19h, 20h) mais um ano de estágio, iniciei a disputa por uma vaga no concorridíssimo curso de engenharia de computação noturno da Unicamp, mesmo tendo feito Cotuca (segundo grau técnico da Unicamp) eu não passei na primeira tentativa em 93, em 94 dividi meu dia entre estudar para o vestibular por conta própria e um trabalho para me sustentar, felizmente em 95 passei, foram mais 6 longos anos entre estudos e trabalho. Naqueles dias os PCs começavam a invadir os lares do Brasil com menos timidez, e, na minha loucura diária, o assédio familiar e no circulo de amigos para "vai lá em casa para dar uma olhadinha no meu computador e tomar um café" era quase constante, pior que só fui aprender a dizer não muitos anos mais tarde, então, foram muitos fins de semana que eu poderia estar estudando ou apenas descansando, passados em casas de amigos e parentes "tomando o tal café" em troca de serviços prestados com pagamento através do tapinha nas costas (e algumas vezes o tal café, que não enche barriga, no máximo engana), uma pequena coleção de desafetos pelos poucos "nãos" que soltava pela absoluta incapacidade de achar tempo e ainda pelos consertos não terminados (alguns não se resolviam em apenas um dia, mas a urgência e cobrança era sempre como se estivesse sendo muito bem pago). Certa vez conversei com um colega médico e ele me disse que esse é um grande problema que enfrentam com familiares. Existe um ditado engraçado, porém tristemente verdadeiro, "Que favor lhe fiz, para tanto me odiar?". Abraços.

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    1. Meu caro Danlucio, você não imagina a satisfação que sinto ao ler comentários como este seu, não me refiro somente ao teor, que é riquíssimo em experiência, mas pelo fato de encontrar eco às minhas palavras. Este é o principal motivo d´eu continuar meus relatos aqui, apesar dos números de visualizações diárias terem diminuído sensivelmente. Creio ter chegado ao ponto de atingir total qualidade ao invés de quantidade (se bem que um número maior de leitores não me deixaria triste :D :D).
      Sobre suas arguições, penso que em qualquer área de atuação sempre existem fatos parecidos. Meu irmão é médico e eu fui testemunha ocular das inúmeras consultas e diagnósticos que ele fez (e ainda faz) gratuitamente. Acho que a maioria não tem noção de que um profissional também precisa comer, né?
      Muitíssimo obrigado por sempre vir aqui e comentar.
      Forte abraço!

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    2. Bom dia, ler esse relato me deu uma certa raiva, eu sou o "cara que manda bem no inglês", e trabalho em um lugar onde se paga mal e se a pessoa tiver qualidades para outras coisas, eles aproveitam o que puder dessa pessoa. Certo dia precisavam de uma pessoa para fazer uma tradução para o chefe, pois o inglês dele é péssimo, após a batata quente ser passada de inglês intermediário para inglês intermediário, falaram que eu era o melhor, e eu, o grande imbecil aceitei, fiz uma tradução com um francês com sotaque extremamente carregado e o máximo que ganhei foi um aperto de mão, alguns dias depois fui chamado novamente, o chefe me chamou como se pedisse para um amigo fazer um favor, e novamente aquele maldito aperto de mão. Uns dias depois, em certo tom de brincadeira, disse para uma parente do chefe que trabalha na empresa que aceitaria dinheiro pelas traduções que fiz, ela me vira e diz: "Mas é bom que você ganhou ponto com o chefe!".
      Creio que não consegui esconder minha cara de desgosto, e claro, haha, realmente desejo pontos com um chefe que sequer olha na minha cara.

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    3. Caro Raul, é como o título do post atesta: a história é velha. Seu relato é o retrato vivo de como algumas pessoas não tem vergonha na cara. Passei pelas mesmas coisas quando trabalhei em lugares onde nem eram ambientes de arte, bastava alguém descobrir que eu gostava de desenhar e lá vinha alguém querendo retrato da namorada, logotipo e até capa de trabalho de escola para o filho de alguém, e geralmente pessoas acima de mim, então, para manter o emprego achava melhor fazer.
      Meu irmão é médico (cirurgião do tórax dos bons) e já testemunhei inúmeras consultas que ele fez de graça.... e, veja, não era o caso de fazer caridade para um necessitado sentindo dor, era gente abusada mesmo, fora o pedido de amostras grátis e até, pasme, pedir atestado médico (algo que ele se nega, claro)!
      Não acredito no "sem noção" acho que a maioria é abusada mesmo.

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