Só para finalizar o texto sobre cinemas de rua.
Eu não podia cita-los sem me referir às salas de projeção do Rio de Janeiro, e mais algumas de Brasília.
O conjunto Nacional em BSB é um shopping óbviamente, mas quando foi criado não tinha este conceito, era um centro comercial, ou seja, várias lojas reunidas num espaço que lembra um maciço prédio de três andares e outros tantos de salas de escritórios. Tanto que costumava-se dizer que ali abrigava o maior número de consultórios odontológicos por metro quadrado do Brasil. Acho que não é exagero. Creio que a definição de cinema de rua se aplica às salas que o Conjunto abrigava.
Havia lá, um outro cinema da rede Karim, Chamado "Cinema 1", mas era uma sala que exibia filmes, digamos, mais "cabeça". Foi lá que vi O Enigma de Andrômeda, e Geração de Proteu, umas das tantas fitas de ficção dos anos setenta que foram bastante badaladas.
Ainda no CONIC, tínhamos outros dois da rede Karim que eram o Miguel Nabut e o Badia Helou. O melhor de todos era o Atlantida. Ah, e claro o Bristol, sem esquecer também do cine Lara em Taguatinga.
Estas salas, creio, por falta de investimentos acabaram virando igrejas, assim como a maior parte das salas de São Paulo, as que não viraram templos, se tornaram estacionamentos, ou se converteram em cinemas pornôs. Pena mesmo.
No Rio de Janeiro, onde morei por quatro penosos anos, o cinema foi meu real escapismo. Eu morava no subúrbio e as salas destes lugares ainda tinham cadeiras de madeira, som ruim, sem ar refrigerado, mas quem ligava? Os filmes exibidos em seção dupla eram dos melhores da safra, Mad Max 1 e 2, Operação Dragão, Tubarão, Inferno na Torre, Conan, o Bárbaro, isto para citar os mais famosos. Em Madureira, havia o Madureira 1 e 2, com salas de luxo, foi lá que vi Star Wars, Rambo (o primeiro), O Império Contra-Ataca, ET, Poltergeist, enfim, o que rolou por lá na época. Na cidade, não lembro bem se era na Tijuca ou no Méier, havia uma sala de projeção (muito boa) que só passava filme clássico e que havia causado certa polêmica num passado recente, como Laranja Mecânica, O Exorcista, Emanuelle, O Iluminado e vários outros que se eu ficar citando, não acabo esta postagem hoje.
Mesmo no interior, onde morei por alguns meses (onde conheci a mãe da minha filha), havia um cinema que só exibia coisa antiga, na sexta-feira à noite, se estou bem lembrado. Foi lá que vi O Homem Que Queria Ser Rei.
Em Realengo, tinha um poeirinha que exibia todo tipo de filme em seção dupla, levei meus irmão menores, quando foram me visitar, pra assistir alguns filmes impróprios, como Amor Estranho Amor, do Walter Hugo Khouri, sim, aquele em que a Xuxa aparece pelada abraçada a um garotinho.
O Gil era um petiz ainda, mas vimos Mad Max 2 e O Mensageiro de Satanás (título feio, né?) em Cascadura.
Acabo de me lembrar de uma história interessante que me aconteceu certa manhã em Realengo. Eu havia ido lá resolver não sei o quê. Andava por uma rua meio deserta, devia ser por volta das 10 da matina, quando eu passava em frente a um desses poeirinhas, escutei alguém chamar, "Ei garoto, ei garoto!" Olhei em volta. Era comigo? "Sim, você mesmo, pode vir aqui?" Vinha do cinema que tinha as grades arriadas. Um cara lá com shorts e camiseta, jeitão de miserável, fazia sinais pra eu me aproximar. O que cê quer? Perguntei. "Pode vir aqui?" Escuto bem daqui mesmo, pode falar. "É o seguinte, falou o cara, trabalho aqui na bilheteria, ontem peguei no sono aqui dentro, fecharam o cinema, e eu fiquei trancado. Só vão reabrir as duas horas. Tô morrendo de fome, poderia me comprar um salgado e um refrigerante ali na padaria? O último a quem pedi sumiu com o dinheiro" Tudo bem, disse eu, cê quer o quê? "Uma coxinha e um guaraná, faz isto?" Claro, passa a grana aí. Fui lá e peguei o que o coitado tinha pedido. "Obrigado, cara, olha, quando quiser assistir algum filme aqui, venha quantas vezes quiser, cê entra de graça". Mesmo? "Claro, enquanto eu estiver na roleta, tá garantido". Nem preciso dizer que toda semana eu tava lá. Foi lá que vi "Down of Dead", o segundo da trilogia do George A. Romero umas dez vezes.
Evidentemente não posso dizer com exatidão o que aconteceu com estes cinemas, mas é quase certo que tiveram o mesmo fim de todos os cinemas de rua tradicionais; foram demolidos ou serviram de espaço para outra coisa.
Muita coisa contribuiu pra isto, o VHS, a TV a cabo, consequentemente a falta de investimento nestas salas geraram a má frequência e daí para a sepultura.
Penso que nesta época, valorizava-se mais a sétima arte, os cinemas exibiam clássicos muito depois do seu lançamento. Lembram o que eu disse sobre Ben-Hur e King Kong? Aonde hoje é possível assistir algum filme do Sérgio Leone numa tela grande? Tudo agora é muito volátil, descartável.
Como ilustração do post, repito aqui duas artes que tem a ver com a matéria.
Alguém disse sabiamente que recordar é viver, ou sofrer duas vezes. E com estas palavras amargas eu finalizo minhas lembranças dos cinemas de rua.
Fala, Eduardo! Belo fechamento de texto e assunto. Graças aos vários lugares em que morou vc têm hoje uma boa vivência de metrópolis do Brasil e seus cinemas de rua. E isso talvez não represente nada pra muita gente, mas pode fazer a diferença pra vc, até mesmo nas suas criações. Por falar nisso, li de cabo a rabo o "Zé Gatão". Viajei durante bons momentos sentado numa espreguiçadeira e tomando um solzinho na varanda. Achei muito boa mesmo. Gostei das referências sobre o Gato Félix e outros personagens. Enfim, vou procurar o outro álbum e aguardar o próximo.
ResponderExcluirUm ótima semana,
Abração,
Fiquei chateado quando os cinemas IMPERIAL e GUARANI (que ficavam no mesmo prédio, em PORTO ALEGRE) fecharam. Os ingressos andam caros... só mesmo aproveitando (quando tem) promoções pela metade do preço.
ResponderExcluirIneteressantes as pinturas com BRUCE LEE e os fortões STALLONE & SCHWARZENEGGER. Me fez lembrar que ontem passou TRUE LIES na SESSÃO DA TARDE, com os devidos cortes... evidente.
Salve, Gilberto, grato por suas palavras gentís e prestígio.
ResponderExcluirOs cinemas de rua ficarão na saudade. Até o Marabá que continua no mesmo espaço, na Avenida Ipiranga, se transformou em várias salas menores, já tomou ares de cinema de shopping. A vida segue seu curso.
Quanto ao Zé gatão, vem boas novidades por aí, só estou aguardando confirmação.
Abração e bom feriado.
E aí, ANDF.
ResponderExcluirSabe toda cidade tem seu cinema de rua que foi tragado pela modernidade. É a vida.
True Lies é um dos melhores filmes do Arnoldão, acho que neste período ele começava a se levar a sério, então começou seu declínio. A derrocada veio de vez agora na velhice, como podem atestar os noticiários. Ele, como os cinemas de rua, ficam agora relegados ao passado.
Como eu disse, a vida segue atropelando como um trem descarrilhado.
Abração.
O Bristol, no conic, era muito legal.
ResponderExcluirDentro da sala tinha um bar com paredes de vidro e auto-falantes
Verdade, Beto. Acredita que eu nunca entrei naquele espaço? Eu geralmente me sentava nas primeiras fileiras próximo ao corredor. Quando estreou o De Volta Para O Futuro não havia espaço nem para se ficar em pé.
ExcluirMuito bacana a história do bilheteiro dorminhoco trancado no cinema! E a ilustra com o Sly e o Schwarza eu ainda não conhecia, muito legal mesmo! Realmente, entre inúmeras outras coisas os cinemas de rua fazem parte de um passado que somente pode ser acessado pela memória. Daí a importância de textos como este.
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