A ilustração que posto hoje me trás algumas recordações doces e amargas.
Dito isto, nem sei como continuar o texto. Escrever, para mim não é uma tarefa tão fácil; melhor dizendo, nem sempre consigo traduzir em palavras o que me vai pela alma.
Eu e minha família passamos quase vinte anos em Brasília; eu em particular, nem tanto, pois quatro destes vinte, morei no Rio de Janeiro. Mas a Capital Federal foi (e é) a minha cidade dos sonhos, mas como já afirmei reiteradas vezes, minha relação com ela se assemelha a estes relacionamentos mal resolvidos. Uma metáfora perfeita seria o caso de um cara que sendo pobre, ama uma mulher rica e mais velha que ele. Seus mundos não conseguem coexistir. Fico sonhando em comprar uma casa por lá, mas as condições nunca permitem, aliás, já nem sonho mais, parece que o tempo insiste em bater na porta de vez em quando para avisar que nem tudo o que queremos na vida podemos ter por mais que se lute.Obviamente uma regra que não se aplica a todos.
Mas vamos ao ponto. Certo dia do ano de 89 ou 90 (não lembro com segurança) meu pai anunciou que pediria transferência de volta para São Paulo. Assim, curto e grosso, ele havia decidido e as opiniões do restante da família pouco lhe importavam. Foi assim a vida toda. De resto, era apenas uma questão de tempo até alguns sonhos desmoronarem de vez.
Pessoalmente, eu vivia um caos particular, que só agravava o misantropismo e azedume já característicos da minha personalidade; desta feita, abandonar a cidade seria a fuga ideal. Eu queria dar mais detalhes mas infelizmente não posso, só sei dizer que tinha esperança de que as coisas mudassem, que houvesse uma solução que não envolvesse algo tão radical quanto uma mudança tão brusca como aquela.
Foi com pesar que vimos os moveis sendo embalados, seguindo na frente. O apartamento enorme da SQS 202, vazio. Apenas alguns itens ficaram para trás, coisas que seriam doadas quando todos embarcassem de vez para SP. Inclusive, meu irmão André foi na frente tentar o vestibular para medicina. As fotos que tiramos no período revelam eu e meus irmãos com cabelos compridos, barba por fazer e olhar duro. Não tínhamos alternativas senão aceitar que a corrida tinha acabado e estávamos longe da linha de chegada.
O que me trás ao desenho de hoje. Naqueles dias usei pedaços de papeis especiais (sobras) e um lápis de cor de pontas rombudas e fui rabiscando o que me viesse na cabeça. Aqueles esboços se perderam, mas este por sorte sobreviveu.
Nós sobrevivemos, mas a família que até aquele momento esteve unida, se rompeu de alguma forma.
Mudamos, amadurecemos (será?), temos nossas famílias, e nos falamos semanalmente, mas aqueles tempos, ah, eles amarelaram mais rápido que o papel que trás esta arte. É como dizia o corvo do Edgar Alan Poe: NEVERMORE.
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Fala, Eduardo! É, vamos ficando velhos (amadurecendo?) e a memória do que aconteceu já não é tão precisa. Preciso mesmo só as sensações e sentimentos da época. Comigo tb é assim. Às vezes me lembro de coisas lá de trás e pra falar a verdade, muitas são como se fossem lembranças de uma outra pessoa, embora saiba que são minhas. Não conheço Brasília, mas deve ser legal e sei que parece ter lhe marcado muito.
ResponderExcluirA analogia com Poe no final ficou perfeita.
Abração,
P.S.: O novo visual do blog tá bem maneiro.
Sim, Gilberto, tudo o que temos são memórias, lembranças da infância, da mocidade, da tarde de ontem, do minuto que acabou de passar. É o que temos, e o que somos. Sem memórias não existimos para nós mesmos. Algumas são tão fortes e belas que uma parte de nós fica presa a elas para sempre.
ResponderExcluirObrigado e um abraço.
PS - Ainda estou testando este visual. Não sei usar tudo o que o Blogger oferece, então....