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segunda-feira, 16 de maio de 2011

A EXPOSIÇÃO DE 1987


Seguindo a onda de nostalgia que me acomete nestes últimos tempos, relembro hoje minha primeira exposição de desenhos..
Como artista sou autoditata, isto porque nunca tive grana pra pagar cursos ou comprar aqueles magníficos livros de como desenhar, de feras como o Renato Silva, ou os importados do Walter Loomis, mas cheguei a ter em mãos aquele do Jayme Cortez que era excelente, e que me deu grandes dicas. Este livro do grande Jayme foi de um rapaz que era pintor abstracionista, filho de um amigo do meu pai, ele me emprestou e nunca mais voltou para busca-lo, e pra ser sincero nunca fiz força para devolver; como castigo ele foi "surrupiado" em São Paulo.
Quando morei no Rio de Janeiro cheguei a tomar alguma aulas com um grande acadêmico brasileiro, mas eu já desenhava naquele período, ou pelo menos rabiscava, tanto que me mantive naquela cidade pintando pequenas paisagens que eram vendidas em estabelecimentos que comercializavam materiais de desenho e pintura no Largo Da Carioca, as vezes na Praça  VX, ou às quartas-feiras na Faculdade Simonsen. Mas isto já é outra história, voltemos a Brasília.
Sabem, alguns me conhecem neste ramo através de cursos que desenvolvi para editoras paulistas, outros pelos  quadrinhos que criei. Eles (os quadrinhos) me dão grande satisfação, pois é por eles que consigo expurgar alguns males que me incomodam e transmitir uma visão de mundo, mas até 1991 quando retornei a Sampa, ser quadrinista não era uma ambição, embora fosse leitor e colecionador de gibis.
Meu sonho era pintar e expor em galerias. Um sonho que teve que ser interrompido por uma série de fatores que não tenho espaço nem tempo para discorrer aqui, mas este desejo permaneceu muito forte por quase toda a década de 80.
Quantos aí já não tiveram aquela sensação, quando, sei lá, uma porta se abriu , um novo amor apareceu, de que a vida dali pra frente seria melhor? De que nada iria abalar aquela confiança? De que aquele estado de coisas seria perene apesar de toda onda contraria?
A tal porta se abriu em 86 quando entrei para a faculdade e através de alguma socialização, percebi que os fantasmas do Rio de Janeiro já não me assustavam tanto, apesar de em algumas noites virem puxar o meu pé. Meus traços no desenho começaram a ser notados e elogiados e não muito tempo depois fui contratado como desenhista no setor de audiovisual do SENAC. Então, viver da única coisa que sabia fazer na vida me proporcionou a tal sensação de progresso e mudança, e comecei a ambicionar mais.
Fortemente influênciado pelo Frank Frazetta, Tanino Liberatore e Boris Vallejo, comecei a fazer uns desenhos a lápis, carvão e sanguinea (eu tinha medo de cores) em papéis que variavam do tamanho A-4 ao A-2, assim, sem nenhum compromisso, só para dar vazão aos meus idílios. Os temas, é claro, eram a arte fantástica. Isto porque sempre fui um sonhador inveterado, fã de mitologia grega, das histórias do marujo Sinbad e de todas as coisas maravilhosas criadas pelo genial Ray Harryhausen no cinema. Sem contar o meu gosto pelo gótico, tanto na literatura quanto no celulóide. Sem dúvida eram desenhos bem toscos se comparados aos de hoje, mas acho que tinham a sua força, pois ao mostrar alguns para uma amigo de sala de aula, ele ficou impressionado e pediu para mostar à curadora do Espaço Cultural do Banco Central que era sua conhecida. Não levei fé que fossem levar aquilo a sério, como eu disse, era apenas para me divertir, mas eu fazia o melhor que podia com o material e conhecimento que dispunha.
Não muito tempo depois recebi um comunicado da própria curadora, dizendo que eu era artista e tanto, uma grande revelação e essas coisas. Havia uma fila de dois anos para expor naquele espaço do Banco Central, mas eu iria furar. Ela me queria para a primeira quinzena de setembro, eu disse, impossível, eu só tinha uns oitos trabalhos prontos e pra preencher o espaço (eu precisaria de pelo menos uns sessenta). Então ficou agendado para a primeira quinzena de novembro.
Comecei então a produzir para o tal evento, mas apesar dos meus esforços não consegui criar tantas obras. A solução foi dividir o espaço com um outro colega de faculdade que também era desenhista. Foi uma coisa complicada para que os trabalhos dele fossem aceitos, mas vou pular esta parte.
As gentís palavras no folder de apresentação foram feitas pelo professor Bruno Matarazzo, um amigo e intelectual de Brasília com bastante penetração na área política e cultural da cidade.
(Inclusive o nome Schloesser está grafado como no passaporte do meu avô).


Perto já de novembro, a luta seguinte foi emoldurar as peças. Eu não tinha grana pra tanto e o melhor preço ficou com uma molduraria do Guará, e vocês sabem, menor preço, serviço duvidoso. O dono do lugar era um picareta, ele economizou na borrachinha que deveria ficar entre a moldura e o vidro, e aquilo a longo prazo foi fatal para as obras.
Transposta esta barreira, o calvário seguinte foi a própria montagem dos quadros no espaço a serem exibidos. Acho que no Brasil, quase tudo é mal planejado, faltaram funcionários para a tarefa, e a coisa acabou ficando a meu cargo e dos meus irmãos. Minha mãe preparou os salgadinhos para a vernissagem e o colega da faculdade entrou com os vinhos.
Como sempre há uma nuvem negra pra obscurecer o horizonte, eclodiu no dia da abertura uma greve de motoristas de ônibus, mas mesmo assim o local esteve cheio. Sucesso. Pelo menos, recebi muitos tapinhas nas costas. Daquele evento não sobreviveu um único ítem, mas não por que tivesse vendido todos os quadros, aliás, não vendi nenhum, mas nos meses subsequentes eles tiveram outros destinos à minha revelia. Na verdade nem fotos teve, pois o fotógrafo encarregado do serviço foi um amigo do meu pai que conseguiu desfocar tudo o que clicou. Como lembrança só ficou o folder que vocês visualizam aqui.
Dei entrevista na televisão, sairam notas em revistas culturais e etc. Fica então a pergunta, se foi tão badalada porque não vendeu ? Eu apontaria dois motivos, um seria os sucessivos planos econômicos da época, tempos de inflação galopante, lembro de pessoas bem abonadas reclamando de falta de recursos. Mas penso que a verdadeira causa mesmo é que naquela época ninguém estava preparado para este estilo de arte. Mulheres aladas, centauros, grifos, bárbaros e antropomorfos não combinavam com sofás. Na verdade acho que até hoje é assim.
Em meio a isto tudo, embora eu não soubesse, a serpente já tinha invadido o meu paraíso. 

4 comentários:

  1. Fala, Eduardo! Puxa, quanta história vc possui, rapaz! Claro, no bom sentido... A verdade é que, apesar dos textos às vezes pessimistas (não me leve a mal), é uma delícia ler seus relatos. Dá pra viajar no tempo e traçar paralelos com nossa própria vida.
    Essa sacada de que a Arte fantástica não seja tão fácil de vender acho mesmo verdade. Deve ser muito mais fácil ornamentar a casa sem polêmica, sem monstros ou garotas seminuas e guerreiros. Embora ornamentar apenas, não seja a maior função da arte. Mas o artista deve sobreviver.
    Pena não ter sobrevivido nenhuma foto da exposição. Seria muito bacana vê-las.
    Ótima semana,
    Abração,

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  2. Gilberto, suas palavras são sempre revigorantes para quem peregrina por este deserto da vida como eu. Muito obrigado pelas suas palavras. Infelizmente, nem tudo o que se passa no meu viver tenho a liberdade de expressar num espaço como este, pois envolve outras vidas, mas sempre que eu sentir necessidade vou colocar aqui as minhas reminicências.
    Sim, pena mesmo, não sobreviveu nenhuma arte desta exposição.
    Ótima semana também e um abraço.

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  3. Du, você é uma das pessoas que mais leva a arte a sério, que eu conheço! Desde muito cedo fazendo a motor que move seus sonhos e fantasias trabalhar. Muito legal, dei uma viajada tentando imaginar os perrengues da época... Que não devem ser muito diferentes dos de hoje, né?
    Abração!

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  4. Não, de fato os percalços não eram muito diferentes dos de hoje, a diferença é que naquele período eu era motivado pela intrepidez e sonhos típicos da juventude, era uma força muito grande que me movia, hoje eu não me atrevo tanto, nem tenho mais tanta energia. Agora, luto mais por uma questão de sobrevivência.
    Suas palavras me incentivam muito, obrigado.
    Um forte abraço.

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ZÉ GATÃO POR THONY SILAS.

 Desenhando todos os dias, mas como um louco, como fiz no passado, não mais. Não que não queira, é que não consigo; hoje, mais que nunca eu ...