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sábado, 2 de maio de 2020

O ALIENÍGENA.

Auto análise.

Acho que as inúmeras porradas que levei ao longo da vida (porradas estas no lombo mesmo e também na alma) me deixaram indiferente ao que possam achar de mim. Se me veem como um grande artista, eu agradeço lisonjeado, mas não muda em nada o que penso de mim mesmo. Considero-me um presunçoso, um imbecil sonhador, uma figura patética de aparência desprezível. E se por ventura disserem que sou um desenhista medíocre (como aliás já afirmaram), tal concepção não me incomoda - pelo menos, não mais - foi-se o tempo em que eu fazia das tripas coração para agradar aos meus circundantes. A partir do momento em que me dei conta de que não consigo me sentir à vontade entre as pessoas, que não me adéquo a um grupo, seja ele qual for, eu comecei a ser menos infeliz. No passado, quando tentava fazer parte de uma sociedade e era rejeitado por ela, tal desprezo me fazia sofrer, depois, com o tempo fui analisando os fatos, meditando na forma como fui criado, percebi que era inútil forçar a minha escalada pelas paredes de concreto do mundo. É difícil explicar, mas é como se eu fosse um alienígena e tivesse sido esquecido pelo meu povo durante sua estada na terra e não me lembrasse disso. O conhecimento de tal fato revela-se uma verdade, que, ainda que doa, vem nela embutida um lenitivo que me faz aceitar a minha posição no planeta: não faço parte dele e minha passagem é breve.

Esta semana estava eu no mercado e me disseram que duas atendentes estavam zombando de mim por eu procurar um produto na prateleira errada. Tempos atrás a esposa do meu cunhado e a filha dela riam pelas minhas costas por causa da maneira que eu me expressava. Alguém disse: você fala muito alto e é como se dirigisse à uma plateia. Nunca me dei conta. Talvez, quem sabe, seja um mecanismo de defesa inconsciente meu. O fato é que isso pouco me importa. Ser susceptível como um anão ou um corcunda vai engrossando sua pele até ela se tornar como a de um jacaré. O escárnio na infância e adolescência causam muitas feridas, mas elas cicatrizam com o tempo e tornam o adulto imune a tais maldades. Pelo menos foi assim comigo. Por isto o desprezo do Lourenço Mutarelli pela minha pessoa - logo ele, que eu pensei que fosse um par por pensar que tínhamos muito em comum- não me afetou. A indiferença dele ao meu entusiasmo de fã, fez com que eu desparecesse da vida dele e esse distanciamento não me faz falta.

Há uma música do David Gilmour e Pete Towshend com a qual me identifico muito, é como se ela fosse feita para mim. Para isto existe a arte, quando nos vemos retratados em uma poesia ou canção, pensamos, pô, alguém se sente como eu. 

Poucas pessoas te empurram para cima, mas não faltam os que colocam tropeços no caminho. Meu pai dizia que eu era como rabo de cavalo, ou seja, crescia para baixo. A mãe da minha filha dizia que eu só servia para ser mandado. Durante anos isso se apegou à minha pele como uma sarna e eu lutei para provar que estavam errados. Infelizmente a dura realidade é que talvez estivessem certos; fracassei na vida amorosa, malogrei como pai, quis ser um desenhista bem sucedido e nunca consegui por mais que tentasse. Sim, eu vivo das ilustrações, mas sempre me esfolando nas sucessivas quedas pela  estrada da arte.

Agora, tanto faz como tanto fez; já disse e repito: o que vier de vantagem, hoje, infelizmente chega tarde. Mas aprendi, finalmente, me conformar com as coisas como elas são (e sei que não vão mudar); resta viver um dia após o outro, como sempre foi; batalhar até o sangue para não deixar faltar nada para a família; esperar pelo menos o perdão de Deus para os meus muitos pecados. Espero não me frustrar nisto também. 

2 comentários:

  1. às vezes, me sinto como se tivesse nascido ou acordado na época errada, tanto cultural quanto socialmente.

    Um ex-colega de classe (do Ensino Fundamental) que tinha um estúdio de fotografia me disse pra imitar o estilo do Jim Lee ao fazer minhas hq's. O que o ignorante não sabe ou se finge de desinformado, é que o artista virou maioral dentro da DC Comics e já não é mais parâmetro pra se seguir ou imitar no mercado americano, embora tenha influenciado muita gente como quando era famoso desenhando X-Men.

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    1. Realmente, meu caro, o Jim Lee foi um dos maiores influenciadores do seu tempo, hoje, acho que nem sabem quem ele é, assim como tem muito jovem leitor que nem sabe quem é Frank Miller. Memória curta não é só privilégio de brasileiro,, sabemos.

      E hoje as coisas estão mais estranhas que nunca, né?
      Força aí.

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