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sábado, 12 de junho de 2021

FALANDO DE NOVO SOBRE ZÉ GATÃO - CRÔNICA DO TEMPO PERDIDO.

O segundo álbum de Zé Gatão tem uma odisseia por trás. Certamente os que me acompanham desde o nascimento deste blog em 2010 já leram as postagens que fiz em 3 partes naquele tempo, mas como dizem, recordar é viver e é bem possível que muitos que vêm aqui sejam leitores recentes e nem saibam que personagem é esse. O primeiro álbum chegou ao público em 1997, uma HQ que desenvolvi em 1994, ficou conhecido como Cidade do Medo ou o álbum branco e paralelo a ele, com a cabeça a mil, cheio de inspiração e ideias eu criava narrativas curtas que ia engendrando nos coletivos lotados, nas filas de banco, nas ruas do centro velho de São Paulo; boa parte das HQs que compõem este livro foram feitas de forma febril ao mesmo tempo que terminava o álbum branco, inclusive uma colorida batizada de Pintura de Guerra, no entanto aquelas histórias urbanas, rápidas, foram encerradas em envelopes e lá ficaram esquecidas por um tempo.

O Cidade do Medo finalmente tornou-se concreto depois que eu e meu pai pegamos um empréstimo num banco e rodamos numa gráfica que nunca tinha trabalhado com um quadrinho na vida e timidamente chegou às mãos daqueles que sempre caçaram novidades fora do circuito mainstream, como eu viria a saber depois.  

Retornei a Brasília (minha cidade do coração) em 1998 numa nova tentativa de viver de arte, naqueles dias eu consegui emprego como desenhista numa agência de comunicação. Foram tempos complicados, meu saudoso irmão Gil como sempre foi uma enorme força. Na verdade nos ajudamos naqueles tempos, ele saía de um casamento complicado e juntos fomos morar numa pensão que ficava na W3 Sul. Nunca vou esquecer aquele período, ele trabalhava de madrugada no Metrô e eu dava duro até altas horas naquelas noites frias (e nos fins de semana), dando prosseguimento às aventuras do felino macambúzio (desenvolvendo Memento Mori e mais algumas narrativas curtas). 

Num evento de HQs (antes disso virar moda) sediado no Park Shopping, a Fábrica de Quadrinhos (antes de virar Quanta) foi a grande convidada. Fui lá uma tarde e encontrei uns velhos conhecidos de São Paulo (Cariello e Marcelo Campos), o Roger Cruz, Vilella e Jotapê eu seria apresentado ali. Fiquei surpreso de saber que eles já conheciam o Zé Gatão e o Jotapê Martins que já lançava álbuns de quadrinhos por sua editora Via Lettera me perguntou se eu tinha material novo. Respondi que tinha várias HQs curtas. Me manda, ele disse. Foi o que fiz assim que pude, xeroquei todas as histórias e enviei pelo correio (lembrem-se, a internet engatinhava naquele período). Não muito tempo depois recebi uma ligação dele dizendo que tinha curtido bastante o material e selecionara seis histórias para figurar no álbum, as demais ficariam para uma outra ocasião, talvez. Algumas cenas, por serem fortes demais, teriam que ser censuradas. Ok, eu disse. Ficou acertado que o lançamento se daria, se a memória não me trai, para o fim daquele ano ou princípio do seguinte. O que eu deveria fazer era escanear as capas, pinups e todas as páginas e enviar em um CD. Tive que usar o equipamento de um amigo músico e publicitário (coitado do Rick Bermudez, eu torturava o moço, saindo da casa dele praticamente de madrugada). Porém, todo aquele trabalho redundou em nada, minha inexperiência e também do editor em me orientar me fez digitalizar a coisa toda errada, era pra ser JPG, eu acho, e eu fiz em outro sistema, algo assim. Isso atrasou a publicação e uma série de reveses fez com que o livro demorasse cinco anos para sair. Nesse meio tempo voltei a São Paulo e o Gil se casou de novo. 

Uma coisa eu sei, trabalhar com uma editora trás certo conforto, mas te deixa sujeito às inevitáveis mudanças no conceito da obra. Além das histórias descartadas e cenas censuradas eu queria que o formato seguisse o mesmo padrão do anterior, eram para ser livros irmãos, se no primeiro o protagonista aparecia de costas num fundo branco, o seguinte era pra ser ele de frente num fundo negro (como nas capas dos discos do Queen e do Emerson, Lake & Palmer). Isso foi aceito, mas o tamanho foi reduzido para o formato livro, meu texto também foi enxugado (o editor disse que eu escrevia textos muito longos). Devo confessar que ele fez um ótimo trabalho no livro, sintetizando muita coisa. 

No início do novo milênio a família toda estava residindo novamente na Capital Federal e nada do Crônica ser publicado. Verônica veio morar comigo mas não estava dando sinais de se adaptar ao clima do Planalto Central (por clima não me refiro ao tempo, mas ao modo de vida). Neste estágio eu produzia quadrinhos eróticos para algumas editoras paulistas.

Crônica do Tempo Perdido chegaria às minhas mãos no  segundo semestre de 2003. Teve uma boa receptividade, matéria em jornais, comentários no Omelete e no Metrópolis e eu cheguei pensar: agora vai. Mas não foi. Não passou de uma euforia momentânea. Vejam, eu não pensei que fosse ficar rico ou famoso mas tive esperança que aquilo me qualificasse para lançar pelo menos um álbum por ano, ou a cada dois anos, algo assim. Notei naquele momento que não havia público para este tipo de material, não havia mercado para o autoral/underground. Por conta desta desilusão eu afoguei muitas ideias interessantes, muitas aventuras que jamais serão contadas. Pra piorar eu tive que sair de Brasília (cidade muito cara) e me mudar para Pernambuco. Longe da família e sem uma renda fixa eu amarguei uns tempos de depressão (que culminaram no bilioso Phobos e Deimos). Mas isto é matéria para se falar em uma outra postagem.

Até lá!


4 comentários:

  1. História incrível de "bastidores" do álbum. Esse ainda não li.

    Nunca falei pessoalmente com os desenhistas que criaram a Quanta, mas tenho alguns deles no Facebook como Marcelo Campos (que primeiro contatei pelo extinto Orkut) e Roger Cruz.

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    Respostas
    1. O Crônica é um livro um tanto raro hoje em dia, mas ainda pode ser encontrado nas livrarias virtuais da vida, já vi no Mercado Livre por preços na faixa dos 25 a 50 reais. Eu diria que poucas pessoas se interessam por um personagem desse tipo, embora encontre alguns que estão conhecendo agora e me passam mensagens de que gostaram bastante. Será que no futuro ele será descoberto e finalmente fará sucesso? Acho que não, mas agora não importa.

      Sobre o pessoal da Quanta, só tenho o Cariello na lista de amigos no FB, mas nunca interagimos, os demais nem sabem que eu existo.

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