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quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

NATAL, 2022 E ZÉ GATÃO - SIROCO EM CAMPANHA.

 

 As artes de hoje fazem parte do meu novo projeto em quadrinhos, SIROCO, a derradeira aventura com meu personagem antropomorfo ZÉ GATÃO que está em campanha no Catarse e desde a inauguração não avançou muito. Não é surpresa, é HQ pouco palatável num mercado onde ainda predominam os mangás e personagens ianques já estabelecidos (eu digo isso por dar uma vista d´olhos em alguns grupos de quadrinhos em redes sociais e vejo o que é consumido e comentado), podemos contar ainda a crise financeira que se abate sobre todos. Seriam boas desculpas, mas a realidade é que não consegui me estabelecer como artista. Eu bem que tentei. De boa, tá tranquilo para mim se a coisa não  decolar.

Para quem quiser pelo menos dar uma olhada na campanha o link é esse: https://www.catarse.me/ze_gatao?fbclid=IwAR1esdjsFu5w8lVkpjBX8CDxLtFdr6xE0-k5NOnjZ7oa-su3vSnJjHt7J88 

Dito isso, me pergunto se vale a pena criar quadrinhos autorais, compensa o esforço? É muito tempo gestando um projeto, depois uma batalha feroz para publicar e ao final me deparar com o descaso e incompreensão. 

As vezes em meu íntimo a necessidade de desabafo se faz presente e minha mente cria histórias, não exatamente com o felino, mas situações do cotidiano. Nesses tempos amargos a ideia de fim de mundo me persegue e seria legal eu dar vida em forma de traços a algumas elucubrações, porém, me falta o tempo e energia, tenho me cansado muito facilmente. Vamos aguardar o futuro (se houver um). 

De toda forma sigo sustentando aqueles que dependem de mim com quadrinhos encomendados, graças a Deus, então minha produção segue em frente. 

É óbvio e ululante que esse, até o momento, foi o pior ano de minha existência, dificilmente algum acontecimento ruim irá superar o que me sucedeu em fevereiro e abril. Desejar que 2021 acabe logo não mudará nada, o ano que segue será mais do mesmo para mim. No entanto isso não é motivo para eu não desejar a vocês, meus queridos e queridas, um FELIZ NATAL E UM PRÓSPERO ANO NOVO (tanto quanto seja possível no meio de toda essa confusão que o mundo se tornou).

DEUS ABENÇOE A TODOS!













quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

SIROCO ENTRANDO EM CAMPO DE BATALHA.

Zé Gatão-Siroco entra em campanha pelo Catarse nesta sexta feira. É a segunda vez que o felino se vê dependente de financiamento coletivo para que sua nova aventura chegue aos leitores. A primeira vez (Zé Gatão PADA) considero que foi um desastre (e não por culpa dos realizadores, mas por desinteresse de um público que eu pensei existir), não sei qual será o resultado com Siroco, mas devemos tentar novamente, claro.

Participei de uma live que irá ao ar nesta sexta feira para falar sobre o personagem, a nova aventura e muito mais.

Vou estar no chat respondendo perguntas e tirando dúvidas.

AGUARDO VOCÊS LÁ!

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

CORAÇÃO FRIO EM DIAS QUENTES..

 "TEMOS A ARTE PARA NÃO MORRER DA VERDADE" - Friedrich Nietzsche.

Deviam dar um Nobel para o cara que inventou o ventilador, não para quem veio com o ar condicionado, isso é coisa de grã-fino, o ventilador é para o populacho, serve ao pobretão e ao endinheirado, para ambos não morrerem de calor. Outro dia vi um vídeo no You Tube um cara que passeia de bicicleta pelos bairros pobres do Jaboatão a título de fazer denúncias, mostrar a pobreza em todas as cores e quem sabe atrair ajuda para essas comunidades. Gente vivendo num barraco que nem era de madeira ou papelão, mas de paredes e teto de plástico preto, destes semelhantes a sacos de lixo. Recicladores, como se auto intitulam. Me chamou a atenção uma das entrevistadas usar uma camisa com o símbolo do Superman.

Não havia comida na mesa, mas não faltava a tv ligada no Globo e o ventilador. A energia vinha de um "gato" no poste. Aqui chamam de "macaco", "gato" é pelo sul. 

Deviam dar um Nobel também para quem inventou a máquina de lavar roupas. Na verdade deviam dar para todos os inventores que facilitaram a vida de muitos seres humanos, bem, talvez tenham dado e eu estou por fora.

A questão é que está um calor brutal, como sempre, já falei sobre isso muitas e muitas vezes, é que não dá pra se acostumar, sabem. Um ano parece bem mais quente que o anterior e assim sucessivamente. Tenho vivido dias horríveis, agitados, meu tempo totalmente esculhambado, trabalhando até tarde da noite porque durante o dia impera o caos e eu não consigo administrar isso. Imaginem que estamos, eu e Verônica em uma canoa com furos, tentando tirar a água e outros fazendo novos buracos. É isso aí, podem escrever na minha lápide: "AQUI JAZ UM CARA QUE PENSAVA QUE ERA DESENHISTA E PASSOU PELA VIDA ENXUGANDO GELO." Mas já devo ter falado sobre isso também e eu não me lembro.

Minha HBP continua presente, ora pior, ora mais ou menos. Sem minha mãe e o Gil aqui tudo o que citei fica pior, bem pior.

Mas era pra falar sobre arte. Hoje chegou um pacote com algumas unidades do álbum DESENHANDO ANATOMIA - SERES FANTÁSTICOS, enviados pela Editora Criativo. Um livro bacana e que me orgulha muito. Tem um posfácio bem bacana do cineasta Claudio Ellovitch.  Anunciei no Facebook caso alguém se interessasse em comprar. Até agora ninguém se pronunciou, devem estar sem grana, ou.....

Se eu não morrer até lá, minha próxima postagem deve ser para divulgar a inauguração da campanha ZÉ GATÃO - SIROCO no Catarse, o editor Marcos Freitas da Atomic Editora está planejando uma live num canal de quadrinhos do You Tube. Não curto essas coisas, não fico bem em vídeo e tals, mas se ele acha que isso pode alavancar a campanha, então vamos lá, façamos esse sacrifício. 

O que eu curti mesmo é o fato de vir uma revista de umas 40 páginas intitulada PINTURA DE GUERRA com a HQ colorida (já comentada aqui no blog) que empresta o título à edição. Não será um encarte, mas um "mimo" para quem participar de uma das metas. Nela teremos uma entrevista, comentários sobre a produção, esboços de SIROCO e o conto SECA CRUEL, escrito pelo Luca Fiuza e com ilustrações minhas. Serão apenas 50 unidades e não será vendida separado depois.

Como sempre, a arte vem como bálsamo sobre a ferida gangrenada.

As pedras começam a rolar ladeira abaixo, onde elas cairão? Vai depender também de vocês.

Abraços a todos!

                           

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

CADA DIA MAIS PRÓXIMO.

 

 Os dias seguem a correnteza da vida, ora correndo mansos, ora tendo que desviar o barco das quebradeiras e curvas traiçoeiras. Fecho os meus olhos no sono e no entanto não descanso o corpo, faço minhas refeições, resolvo as dificuldades do dia a dia com a misericórdia de Deus, realizo o meu trabalho, mesmo com lágrimas, da melhor maneira que posso - embora sempre achando que meu melhor nunca é suficiente - e vou existindo. 

Entretanto sei que tudo isso é um palco onde eu, como perfeito canastrão, represento meu papel. À noite, ao final de cada espetáculo, quando retiro a máscara, após limpar a maquiagem, o medo que me acompanha desde a mais tenra idade se corporifica como entidade malévola. Mas não é um horror de coisas palpáveis e sim pavor de saber que certos sonhos são irrealizáveis, é da certeza de que certas coisas não são possíveis de obter por mais que se deseje e lute. 

Acho que a maioria não entende as coisas que me vão no íntimo. Elas não são devidamente expressáveis em palavras, teriam que estar no meu lugar para saber. 

E nossos barcos seguem os alinhamentos da água, o fluxo inexorável que nos conduz ao mesmo destino. 

Fiquem todos com Deus e obrigado pelos bons auspícios!

  

terça-feira, 9 de novembro de 2021

IDEIAS AO SABOR DO VENTO.

 O calor está forte, beirando o insuportável e acho que ainda vai piorar, sempre é assim até março ou abril. As chuvas aqui não conseguem esfriar o clima e quando chegam causam um desastre alagando ruas e acabando com a vida (literalmente) de muitas pessoas que tem a má sorte de habitar próximo a córregos e morros, e ainda deixam de herança os terríveis pernilongos, aqui chamados de muriçocas. Se tem uma coisa que odeio de morte são insetos, mosquitos, baratas, argh! Não a toa no meu universo antropomorfo eles são os grandes vilões, monstros repulsivos que ninguém suporta. Tenho muita simpatia pelos pássaros, eles comem insetos. Mas os répteis também se alimentam dos seres de seis patas e não nutro afeição por eles. Mas gosto de gatos e desdenho dos cães. Na verdade gosto dos cães, é sério, tivemos dogs em casa, éramos crianças. Nas minhas HQs do Zé Gatão eles são aqueles tipos que fazem seu trabalho, os paus mandados dos superiores, milicos ou seguranças em sua maioria. Hoje eu vinha pela rua perdido em meio a um rio de saudades quando um cachorro surgiu no horizonte e lá veio ele rosnado para o meu lado, parou uns metros à frente e começou a latir, eu avançava e ele recuava, sempre latindo como um imbecil, não dei atenção e prossegui, ele cansou e seguiu por outra direção em uma esquina. Se tivesse mais de um eu teria motivos para me preocupar (isso já aconteceu algumas vezes na minha vida), entendem o que quero dizer? É um bicho covarde que ataca em bando. Claro que falo de cães de rua. Agora os gatos não, ficam lá na deles, se lambendo e dormindo preguiçosamente durante toda a tarde, quando passo fico a observa-los e eles olhando de volta como quem diz: "tá olhando o quê, idiota?". 

Bem, chega de falar sobre a natureza. Prossigo na labuta diária de produzir páginas de quadrinhos para três clientes distintos. Amo o que faço mas as vezes tenho a impressão que meu cérebro vai virar gelatina, as juntas do meu indicador direito estão sensíveis, doem. Mas as artes estão ficando boas.

Minha multifuncional, depois de me auxiliar por tantos anos se despediu. Primeiro foi a impressora que deu pau, agora por fim, o scanner. A luz acende mas ele não responde mais, como se estivesse em estado vegetativo. Tirei dinheiro de onde não tenho e comprei uma nova. Ainda estamos nos entendendo, uma outra marca e eu aprendendo como usar. É assim em tudo na vida. No passado, eu convivia com uma mulher e conhecia bem seus hábitos e humores, depois com outra eu tinha que me readaptar a uma outra situação. Bah, aqui estou eu filosofando idiotamente como sempre.

O grande mestre e artista Flávio Colin volta a ser publicado. Editoras pequenas tem colocado na praça álbuns de luxo com capa dura e tudo mais. Eu, claro, me esforço para prestigiar pois sou grande fã (tem um texto meu sobre ele que pode ser lido aqui: http://eduardoschloesser.blogspot.com/2011/01/obras-que-recomendo-estorias-gerais.html). Essa redescoberta é mais que bem vinda para quem gosta de um bom quadrinho, mas para ele, no meu entender, tanto faz. Fico triste com isso mas alegre pela família dele pois são eles que colhem os frutos, esse é o legado do artista. 

Melhor para o Mozart Couto que também ressurge em álbuns com grande acabamento gráfico (Zamor e Brakan) pois ainda está vivo e pode vindimar os louros de seu talento.

E por fim, um Venom que fiz há um tempinho atrás. Não, não vi o novo filme.

Fiz só pra desopilar mesmo.

Beijos a todos.


segunda-feira, 25 de outubro de 2021

A SENSAÇÃO DO VINHO TORNADO EM VINAGRE.

 Boa noite, como vão vocês?

Eu? Bem, seguindo.....    amanhã (dia 26) minha mãe faria 78 anos. E na quinta (dia 28) meu irmão Gil completaria 52. Então, creio que não preciso dar detalhes do vazio que engole minha alma como o buraco mais negro. Podemos pular essa parte e falar um pouco sobre minhas tristes caminhadas até o comércio para comprar pequenas coisas, só nesses momentos é que eu saio um pouco de casa; nas filas, as pessoas quase apagadas para mim, como vultos. Um detalhe: cada vez menos respeitam o tal distanciamento social, elas parecem não ter rostos (ou eu que não vejo?). De um tempo pra cá, posterior à transformação abrupta do mundo, só vemos os olhos das pessoas. Pra mim, na verdade, muito antes disso, a maioria sempre me pareceu cinza, gasta, como se fossem feitas de papelão. Sombras que saem de seus esconderijos para levar seus cães pra cagar. 

Oitenta por cento do meu tempo eu passo sentado na prancheta brincando de ser desenhista, convencendo a mim mesmo que ganho meu dinheiro honestamente sem enganar os outros. Digo isso porque meus traços atuais me parecem saídos a fórceps, não me parecem espontâneos. O vigor e naturalidade parecem ter me abandonado. Dou o melhor de mim e mais que nunca parece não ser o suficiente. Mas não há o que eu possa fazer, tenho que colocar comida na mesa e não tenho tempo para encontrar um modo de ressuscitar o velho artista do Zé Gatão que desenhava quase por instinto e produzia das entranhas e não do cérebro (e não digo isso afirmando que antes eu era bom).

Três projetos alternadamente cansam um bocado, principalmente neste calor, o cérebro parece se transformar em gelatina. No mais recente, eu crio o roteiro também e este é o que tem o prazo mais apertado. Ouço falar de artista do passado, tipo Jack Kirby e John Bucema que desenhavam várias páginas por dia (o que colocavam na água deles?). Bem, vi certa vez algumas páginas do Bucema para a Espada Selvagem de Conan que mais pareciam garranchos e que foram transformadas em obras de arte pela arte final do Alfredo Alcala. 

Esboço do meu mais novo projeto.

Bem, meus queridos e queridas, venho aqui sempre que puder respirar um pouco para dar notícias e se for o caso, como hoje, desabafar um pouco com vocês.

Se cuidem.

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

UM PAPO BREVE (e sem arte nova para mostrar).

 Neste exato momento estou cansado, muito cansado. Minha mão direita dói, mais especificamente meu dedo indicador, isto porque trabalhei bastante, na verdade não tanto como gostaria, houve tempo em que eu fazia mais de uma página de quadrinho a lápis por dia e não me queixava, hoje fiz uma e me sinto exaurido. Stress? Idade? A soma dos dois? Pode ser. Eu deveria trabalhar mais, o tempo urge, mas a verdade é que não consigo. Melhor parar para não comprometer a qualidade das obras.

Mas é este cansaço adicionado a um enfado da alma que na maioria das vezes me impede de sentar aqui e trocar umas ideias com vocês. Antes tinha um pensamento, traduzia em palavras e elas ficavam registradas aqui. Quase toda as minhas memórias estão registradas neste blog, as de maior relevância, pelo menos. Faltou, eu sei, o período de vida militar que durou quase dois anos e nem sei se terei fôlego e disposição para tais relatos....talvez se eu dividir em pequenos capítulos eu consiga, quem sabe?

Hoje, em meio ao luto que ainda é muito evidente e mastiga a minha alma de infante, recordei um pouco o passado, lembrei de uns parentes do meu pai que vinham se hospedar em nosso apartamento em Brasília, evoquei a Fifi, nossa cadelinha pincher, todo o final dos anos 70, enfim.

Esses tios, tias e primos, primos em segundo grau e tutti quanti, vinham geralmente de Belém do Pará com destino à São Paulo e no caminho ficava o Planalto Central, porque se hospedar em um hotel se podiam ficar num baita apartamento com tudo à disposição, não é mesmo? Verdade seja dita que meu pai tinha prazer em recebê-los, e minha mãe sempre foi boa anfitriã. Meus irmãos eram muito tenros, nem sei se para eles fazia alguma diferença, mas para mim aquilo tudo era horrível, nunca havia espaço nem privacidade, os primos eram os sabichões que me tratavam como seu fosse um bocó do interior por eu ter esse temperamento serio e arredio, sempre foi assim. Não rememoro isso com raiva, não, juro!

Bem, o caso é que essa sobrinha do meu pai (ela quase tinha a idade dele, era a primogênita da minha tia mais velha) estava em vias de separar do marido e veio ficar uns tempos com a gente. Ela e os filhos. Para mim aquilo nunca foi legal. Hoje todo mundo é adulto e gente "séria", mas o período da infância pode ser bem infeliz dependendo do temperamento do pirralho, se é menos ou mais suscetível. Eu sempre fui uma espécie de anão (ou corcunda). 

No começo da estada deles lá, tudo bem, depois a coisa começou a azedar, como tudo azeda com o tempo. Eu fui para umas férias no Rio de Janeiro e minha mãe contou umas coisas daqueles tempos que rememorando hoje acho até cômico. Um desses fatos me assaltou a mente hoje: a tal prima tinha ido à rua e voltou com um certo pacote e se fechou com a filha no quarto. Minha mãe bateu na porta para comunicar alguma coisa e só atenderam depois de uns longos minutos, nesse meio tempo a Fifi entrou no cômodo, mamãe e a sobrinha do meu pai falavam quando elas viram a cachorrinha comendo um bolo atrás da cortina. Foi isso, a paraense comprou um petisco e se trancou no aposento para deguustar sozinha com a filha e quando minha mãe bateu na porta elas ocultaram a guloseima, não contavam com o faro da Fifi. Feio, né?  

Uma coisa que lembro bem é que toda vez que aquela mulher entrava no banheiro deixava um insuportável cheiro de merda que demorava um tempo anormal para sair.

Claro que o casal se reconciliou para se separar de novo e voltar a se reunir.  

Certa vez, já nos anos 90, em São Paulo, ela fazia uma excursão (não sei de onde para onde) e o ônibus parou na Praça Princesa Isabel, próximo de onde morávamos e ela foi até nós, só para falar de suas viagens pela Europa e torcer o nariz para nossa decadência. Blá, blá, Grécia, blá, blá, Espanha, blá, blá, minha filha se casou com um cara endinheirado e foi morar em tal lugar no exterior, blá, blá, Bélgica.

Olhou o relógio, estava na hora de voltar à excursão. Pediu pra usar o banheiro. Cagou e foi embora deixando no ar de nosso humilde apartamento aquele cheiro de bosta e alguma depressão. Eram dias frios e cinzentos em São Paulo.

Não tão frios e cinzentos como são hoje em dia, apesar do calor.  

sábado, 25 de setembro de 2021

RELEMBRANDO MEMENTO MORI E DAQUI PARA ETERNIDADE.

 

 Acho muito difícil eu criar novas HQs de Zé Gatão. Ainda há SIROCO para publicar e também as várias narrativas curtas que devem preencher uns dois álbum com mais de cem páginas cada um. Essas histórias breves eu fiz ao longo dos mais de vinte anos que o personagem existe para os leitores (caramba, tem uns trinta anos que o felino cinza foi gestado!). No entanto para esses materiais não há nada concreto em termos de editoração. Da minha parte não há pressa. 

Porque não há desejos de criar nada novo com o personagem? Sabem, entendo bem porque o Led Zeppelin acabou depois da morte do John Bonham, ou o porque os dois membros restantes do Rush não substituíram o Neal Peart após o falecimento dele. Penso que esses músicos foram tão importantes na trajetória dessas bandas que sem eles o som não seria mais o mesmo. Há a questão do respeito também. Sou grande fã do Queen, mas colocar outros cantores no lugar do Mercury não me soou bem, tanto que nunca ouvi o material novo. O que as bandas de rock tem a ver com Zé Gatão? Simples, sem mamãe e Gil minha fonte de inspiração secou. O Felino é um personagem muito querido, faz parte da família, difícil eu elaborar novas sagas se minha mãe e irmão não estiverem aqui para compartilhar comigo as alegrias e tristezas nesta jornada de criação, publicação e divulgação. O que está feito vou dar um jeito de que venha a público (inclusive planejo um livro com todos os contos escritos pelo Luca Fiúza), mas material novo não; pelo menos não por um bom tempo.  

Gosto muito de Memento Mori e Daqui Para a Eternidade, tenho orgulho de ter concebido esses livros; com eles, creio, provei o que tinha de provar em termos de desenho e narrativa gráfica. 

Assim que o álbum branco foi lançado ficou a pergunta: o que aconteceu com Zé Gatão após aquele cataclismo? Eu era indagado por alguns leitores - e cobrado também - se haveria continuação. Lógico que eu pensava em novas histórias mas não tinha em mente um prosseguimento a partir daquele ponto. No entanto uma centelha brilhou no escuro da minha alma e pensei numa situação de revolta e vingança misturando elementos místicos com um pé no terror. Ideias começaram a brotar e ainda em 1998, morando numa pensão em Brasília - com meu querido irmão Gil - eu comecei a corporificar as abstrações que vinha tendo. Rabisquei um roteiro básico e vários garranchos para me situar. Labutava de madrugada, durante o dia eu ganhava o pão trabalhando numa agência de comunicação concebendo quadrinhos instrucionais. Tinha muito gás e sonhava com muitas boas perspectivas. A principio ela não era para ser tão longa mas as conceituações foram brotando e eu dei tratos à bola. 

O meu plano era publicar na Via Lettera,  logo depois que o Crônica do Tempo Perdido viesse à baila. Os anos passaram e Crônica demorava, nesse meio tempo eu ia tocando Memento Mori e histórias mais curtas. Todo o desenvolvimento se deu entre Brasília e São Paulo (nesses tempos eu alternava de um lugar a outro) sendo que eu finalizei em Pernambuco, onde vim morar em 2003. Quase seis anos para concluir tudo! Como a história tinha mais de 400 páginas eu dividi em três partes intituladas "Memento Mori",  "Ventos da Noite" e "Anátema". Achei que seria mais fácil oferecer assim para quem se interessasse. Depois tudo isso mudou, como veremos à frente.

Crônica do Tempo Perdido finalmente foi publicado e houve certo barulho, mas não "aconteceu" e Memento Mori não passou de intenção por parte da Via Lettera.

De qualquer modo, alguma fortes  decepções com o mundo dos quadrinhos me fizeram envelopar o material e aguardar. Ele só saiu para respirar quando certa vez, ao telefone, o editor Leandro Luigi Del Manto, que sempre disse gostar do que eu vinha produzindo em São Paulo, me perguntou se eu ainda tinha aquelas páginas do Zé Gatão. Sim, disse eu. Me mande amostras do material, falou ele, pretendo mostrar aos publishers. Mandei. Isso deve ter sido por volta de 2006. O Douglas, um dos donos dono da Devir, achou melhor esperar. O anseio durou até 2011. Nesse meio tempo eu dava sequência a outros projetos, A Vida e os Amores de Edgar Allan Poe foi o principal deles.

Em 2011, decidido a acabar com as férias forçadas do Felino cinza, retirei da gaveta as HQs curtas que havia feito nas décadas passadas e motivado pela publicação do Zona Zen (criação do amigo Nestablo Ramos) pela revista Prismarte, procurei o Leonardo Santana - que dizia ser fã do Zé Gatão - e ofereci qualquer uma das histórias curtas para fazer parte da Prismarte. Ele gostou tanto da ideia que levou o caso para os outros membros da PADA. O resultado foi que decidiram não por uma, mas por várias HQs, elas fizeram parte do já comentado aqui especial Graphic PADA. 

Neste mesmo ano o Leandro, vendo um momento favorável tornou a abordar o Douglas que topou finalmente publicar o Memento Mori. Aleluia!

Como eu tinha que fazer uma viagem a São Paulo para o aniversário da minha sobrinha (Alice, filha do André) eu aproveitaria e combinaria in loco com os editores da Devir os detalhes do novo livro. 

Minha ideia, claro, era um tremendo calhamaço com as mais de 400 páginas em formato álbum (o formatão típico dos europeus), mas naquela tarde quente em que estive na agradável companhia do Douglas e do Leandro eu me vi frustrado em minha tentativa. Para um melhor aproveitamento de papel e outros detalhes técnicos que um editor entende melhor do que eu, Memento seria dividido em duas partes e as medidas seriam como as de um livro normal. Tudo bem para mim, era melhor aquilo que nada.

Memento Mori viria a público em outubro de 2011 depois de ficar no ostracismo por oito anos!!!!

Infelizmente não teve a receptividade que eu imaginava, não como o Crônica do Tempo Perdido apesar dos esforços da editora em divulgar, contudo foi bem resenhado pelos  Melhores do Mundo e alguns jornais com pequenas notas. No entanto os sites e blogs especializados em HQs o ignoraram solenemente. Mas obtive retorno de alguns leitores e elas não poderiam ser melhores. E isso é o que de fato faz valer a pena o esforço.

A segunda parte ficou prometida para dali a uns seis meses.....e demorou cinco anos!!!!!

Eu tinha dois títulos para a continuação: Daqui Para a Eternidade e Tapetum Lucidum. Botei em votação entre meus três irmãos e o Leandro. Eternidade ganhou de 3 a 1 (só o André optou pelo nome em latim). 

Daqui Para a Eternidade virou realidade em maio de 2015 e não foi comentado e anunciado por ninguém, mais uma vez obscuro, só que sem as notas de jornal que tinham dado destaque ao volume anterior. Mas para mim isso não importava de fato, me bastava saber que finalmente eu tinha tirado esse esqueleto do armário e eu sabia que ele era bom, muito bom! O resto, era o resto. 

Essas sementes darão frutos mais saborosos num futuro? Talvez sim, talvez não, já não me importa. Botei a mão na massa e às duras penas fiz acontecer sem puxar o saco de ninguém. Durmo tranquilo quanto a isso.



domingo, 19 de setembro de 2021

OS DIAS DA GRAPHIC P.A.D.A. ESPECIAL ZÉ GATÃO


 Como voam os anos! 

Hoje passei o dia de cama, adoentado com um problema que vez por outra vem me atormentar, a velha lesão nos músculos lombares. É assim, eu procuro tomar cuidado ao erguer algum peso extra sabendo que tenho essa limitação, no entanto as vezes só de me abaixar para pegar algo no chão sinto uma espécie de choque no local e fico torto. É UMA MERDA ISSO! Tem vez que é leve e passa logo, noutras não consigo ficar em pé ou sentado muito tempo, e ficar deitado cansa. É horrível porque além de tudo há muito trabalho a ser feito e o tempo é cada vez mais reduzido.

Precisei, na manhã de ontem, tirar água da cisterna com baldes para encher um enorme barril. Depois de uma meia hora nesta aventura as costas travaram. Verônica veio e qual uma guerreira amazona completou todo o serviço de encher o tonel com água. E eu como um velho decrépito tive que me conformar em andar como um símio no seu ocaso.  

Mas comecei essa postagem falando da passagem do tempo, né? Eu conversava com a Vera sobre uns acontecimentos de 2010 e 2011 e na minha mente veio à lembrança a publicação independente Graphic PADA Zé Gatão. 

É um gibi legal (embora eu seja suspeitíssimo para falar), um tanto triste, mas foge um pouco do terreno da aventura e violência sempre presentes. 

Sei que é bobagem comparar os tempos passados com os de agora, até porque cada período tem suas alegrias e tristezas, mas como não confrontar? Naqueles idos meus pais estavam vivos, meu irmão Gil também, a avó e irmão da Verônica idem. Havia aquela vontade natural de continuar produzindo, o sonho de morar num lugar mais aprazível e tal. 

Pensando hoje, vejo como a deterioração de tudo na minha vida não foi de forma imperceptível, ela se escancarou principalmente após o ano de 2014, talvez até um pouco antes. Mas eu nem posso me queixar, de fato, sempre colhemos o que plantamos e eu nunca discerni bem quais sementes eram boas.

Apesar de tudo, eu não tenho vontade de reler o Zé Gatão PADA, nem qualquer outro quadrinho que eu já tenha criado.

Agora falam de um possível tsunami a inundar a costa nordestina por causa do tal vulcão lá das Ilhas Canárias. O que eu poderia fazer? NADA! 

É isso, esse blog continua com cada vez menos leitores. Pudera, eu só venho aqui para reclamar!

Vou me deitar um pouco pois minha região lombar requisita repouso.

Seguimos em frente. Beijos a todos. 

domingo, 5 de setembro de 2021

BLACK BALLS

 Trabalho, trabalho e trabalho. É só o que faço. Não só trabalho com arte (argh, ainda me incomoda usar essa palavra para designar o que faço, arte mesmo fez Beethoven, Rembrandt, mas vá lá) mas em inescapáveis tarefas domésticas. Por isso admiro e invejo tanto os gatos. Dormem pra caralho e sempre encontram a comida no prato, e a água, e o carinho (da minha parte, pelo menos). Bom, pensando bem, só se for os gatos das madames, gatos de rua podem até dormir muito durante o dia mas rango fácil é outra história e durante a noite sempre são batalhas homéricas por território, por uma trepada, sei lá.

 Adotamos um gato em nosso prédio. A mãe dele apareceu certo dia e uns vizinhos a alimentaram e depois ela não saiu mais daqui. Nós também sempre dávamos leite a ela. Aí ela engravidou (claro). Três rebentos, o pai devia ser um siamês, dois machos com aquelas colorações típicas dos siameses e uma preta igual a mãe. Depois nossos vizinhos se mandaram daqui e continuamos a alimentar os felinos. Os pequenos eram ariscos que só. A pequena preta desapareceu (roubaram? mataram?) mas os outros dois eu fui me  aproximado e até mesmo encurralando num canto e depois de muito cansaço acabaram me aceitando. Um deles nós batizamos de Vesgo. Isso mesmo, olhos azuis e zarolho. O outro alcunhamos de Saco Preto. É exatamente isso que vocês pensaram, as bolas dele são pretas.

A mãe deles foi vasectomizada e hoje vejo-a bem pouco, o Vesgo também, acho que encontraram refeição num prédio próximo, de vez em quando aparecem aqui, mas o Saco Preto não, esse nos "adotou", nosso pequeno prédio se tornou o seu território, diariamente ele tem sua ração, água e muito carinho meu e da Verônica, mais meu, na verdade. Deixamos ele entrar um pouco em casa e desfrutar de nossa companhia, depois ele se cansa e vai embora. Não raro ele  aparece ferido pela manhã, numa das últimas vezes haviam ferimentos feios na cabeça, como se fossem feitos por presas caninas (estaria ele enfrentando cães em suas rondas noturnas?). Nesse ponto ele me lembra o Zé Gatão. Certa vez o ferimento foi no rosto, o que lhe conferiu uma baita cicatriz. Sempre cuido dele passando uma medicação sobre as chagas. É muito bom quando me aproximo dele e ele encosta sua testa na minha, é como um pequeno bálsamo para essa dor que teima em habitar o meu peito, essa saudade que sei, nunca vai morrer.

Na verdade não era minha intenção falar sobre gatos hoje mas ainda bem que vieram à baila, ariscaria  repetir minhas lamentações. Os trabalhos continuam e estão ficando bons mas nada de projetos pessoais, esse dormem e nem sei se acordarão um dia. Como o dinheiro acabou, agora batalho um terceiro trampo que pague as contas. Se conseguir (espero, preciso!!!) estarei acumulado de tarefas, então se eu  demorar a vir confabular com vocês aqui, já sabem o motivo. Mas prometo vir pelo menos para deixar uma arte, ok?

Beijos a todos vocês e muito obrigado!

  

domingo, 22 de agosto de 2021

UM PASSO PRA FRENTE E DOIS PARA TRÁS.

 

O calor dá sinais de retorno após um breve tempo de frio, algo bem incomum nesta região do país. Eu aproveitei cada segundo, dormi até com algumas cobertas, vejam só!  Mas a quentura sempre incômoda já acena no horizonte, nada há que possa impedir aqueles momentos de enfado, suor abundante e noites mal dormidas. Mas como nos recomenda o livro sagrado, por tudo temos de dar graças. 

Antes eu tinha sonhos de sair daqui, ir para outro lugar, um lugar que fosse bem tranquilo e mais frio (notem bem, falo de frio suportável, ok?), meu objetivo sempre foi voltar para Brasília, mas hoje não mais, eu e a cidade dos meus encantos nos divorciamos de vez, tudo, claro, porque mamãe e Gil não mais estão entre nós, eles sempre fizeram parte daquele lugar. A perda me afetou de tal forma que não tenho mais como recuperar o antigo eu, o Eduardo Schloesser que existia até o início de fevereiro deste ano se foi para sempre, o de hoje vive e respira mas não passa de uma cópia mal feita do outro. Estou tentando me recompor, me reconstruir para continuar a passar pela vida, trabalhando (e trabalhando duro, como podem ver pelas artes neste post) afim de obter o teto e comida na mesa, mas sem sonhos. Não haverão mais aventuras do Zé Gatão. Tenho material suficiente do felino para mais uns três álbuns (se conseguir publicá-los), mas é tudo coisa antiga, inédita, mas antiga. Parecia até que eu antevia que SIROCO seria mesmo a última saga e foi concluída em fins de 2020. 

Não quer dizer que não vá mais criar quadrinhos autorais, tenho roteiros prontos há muito tempo e a ideia era corporificá-los aos poucos como sempre fiz, mas agora é uma incógnita, no presente instante não há a menor vontade para isto. Histórias eu tenho para contar, mas não sei se vale a pena, é tudo muito difícil de realizar, antes eu me dava por satisfeito só em ver o projeto pronto, finalizado, eu dividia este prazer com mamãe e Gil, agora é como se eu tivesse apenas o vento ao meu redor. Claro, tenho ainda o André e o Rodrigo, mas este meu mundo não é o deles - não os critico de forma alguma, eles tem suas dores e lutas para enfrentar - simplesmente minha arte era algo entre nós três, principalmente o Gil, com quem eu confabulava sobre minhas criações e ambições. Nesse ponto fiquei definitivamente só e devo arcar com o peso. 

Hoje me torturei revendo as últimas mensagens escritas por ele enquanto esteve internado no Hospital de Base de Brasília, antes de ser entubado. Me lembrei do choro inconsolável do André ao telefone na fatídica noite do dia 20 de Abril, da minha caminhada pelas ruas escuras do meu bairro tentando sorver oxigênio e sentindo o vazio que teimava me abarcar por todos os lados. Recordei as palavras do Rodrigo dias depois: "Estou muito triste, vou chutar a bola pra frente e correr atrás dela com lágrimas nos olhos".  Isso tudo ainda sob os efeitos da despedida da nossa genitora. 

Phobos e Deimos veio a público depois de ficar engavetado por 15 anos, veio no momento certo e é incrível como as histórias retratam tudo o que sinto hoje. 

Sigo em frente, com a ajuda de Deus, até o dia do reencontro.

Minha saúde anda ok. Sinto uma dor de cabeça constante ultimamente, não forte, mas onipresente. Há um dente precisando de extração e eu ainda não cuidei disso. Não posso ficar à base de analgésicos. Vou tentar providenciar a tortura esta semana.

Fiz exames e segundo meu irmão médico minhas taxas estão muito boas, nada de colesterol alto ou diabetes mas me sinto ofegante quando subo escadas muito rápido, não faço exercícios desde o início deste maldito ano, tenho que recomeçar.

Minhas reservas de grana estão no fim, porém ainda sigo trabalhando, o pagamento por uma das duas HQs que realizo atualmente foi realizado pelo roteirista antecipadamente.

Para fugir um pouco da realidade tenho visto uns filmes e séries, além de ler, claro. Mas isto é matéria para a próxima postagem.

Até lá, se Deus quiser.

sexta-feira, 6 de agosto de 2021

UMA HISTÓRIA REAL OCORRIDA NA PRIMEIRA METADE DOS ANOS 90.

 Zac torceu o nariz ao som da campainha. Não havia ninguém em casa e ele pensou que poderia dormir tranquilamente. Devia ser quase duas da tarde e um bom cochilo depois do almoço era tudo o que ele achava merecer depois de passar a madrugada trabalhando. Bom, pensando direito, merecia porra nenhuma, afinal, ser sustentado por pai e mãe com mais de 30 anos chegava a ser infame. Ao ser cobrado por não ser independente, ele respondia que não fora ele que escolheu a profissão e sim que fora escolhido por ela. E a profissão que o escolhera não lhe oferecia meios de ganhar dinheiro e ter sua própria vida.

Falávamos da campainha. Ela insistia. "Merda, quem será?" Fazia frio, aquele frio que só era possível numa cidade como São Paulo, aquele clima que deixa a cama gelada como se jogassem um balde d´água em cima, mesmo assim ele estava nu sob as cobertas grossas. Mas voltemos à campainha, ele levantou-se, colocou a cueca, uma bermuda e foi atender. Era o Fat. Só podia ser, quem poderia ser mais inconveniente? Quem falava tão alto não importando onde estivesse? Quem poderia encher mais o saco senão o Fat, com aquele topete à la Elvis e cara de menino chorão? 

Fat era desenhista. Zac também era. Só que o Fat ganhava uma grana ilustrando algumas revistas da Editora Abril. Zac não ganhava quase nada com desenho.

- Fala, meu, cuméquitá? indagou o visitante com sua voz que parecia de um desenho animado. 

- Tô indo.

Zac não convidou o Fat para entrar mas ele entrou assim mesmo. Sentou se no sofá  e se espalhou.

- E aí, tá pronto?

- Pronto pra quê?

- Ué, pra ir no HQ Mix.

- Ah, eu não vou pro HQ Mix.

- Não acredito!

- Olha, Fat, não tenho mais saco pra esse tipo de coisa.

- Que foi Zac, tá com dor de cotovelo porque o seu livro não faturou nenhum prêmio? 

- Não é nada disso.

- Fala a verdade.

- Tá legal, eu fiquei puto no começo, afinal, se eu tivesse perdido para um cara bom, mas aquela bosta que escolheram? Mas na boa, não é por isso não, tenho consciência que meus quadrinhos são melhores que os daqueles caras. Não fui escolhido em nenhuma categoria, fazer o quê?

- Bem, então vamos lá, temos que prestigiar.

- Não suporto mais isso, sabe, ir em lançamento de gibi de tal autor, entrega de prêmios....me sinto como peixe fora d´água, totalmente deslocado.

- Eu não dou a mínima, sabe, eu...

- Aqueles caras, meu, vão lá receber o seus prêmios, se sentem como se estivessem na festa do Oscar, se achando os tais, depois formam suas panelinhas e ficam conversando merda sobre quem é mais legal, o Aquaman ou o Namor, ou os cartunistas dos jornais discutindo política como  se fizessem qualquer diferença. Francamente cansei de tentar me enturmar com esses nerds com suas namoradinhas, se exibindo como babuínos, disputando quem tem o cu mais vermelho. Cansei, cara, cansei mesmo!

- Rapaz, como cê tá azedo!

- Bem, eu não poderia ir mesmo que eu tivesse afim, tenho que resolver um negócio para o meu pai, logo mais a noite, um negócio chato pacas!

- Bem, é uma pena, vai tá lá aquele italiano que desenha o Ken Parker.

Zac já conhecia o italiano, na verdade tinha até um álbum autografado, o artista, inclusive, escreveu seu nome errado na dedicatória, então, para que ir lá ver o cara em mais um momento de glória? Ele já devia estar com o saco dolorido de tanto ser puxado. 

- Então, tem feito coisa nova?

O Fat era assim, só trabalhava se lhe encomendassem as artes, Zac não, ele desenhava porque precisava, para extravasar sua frustração frente à vida. E o Fat sempre queria ver as novidades.

- Bem, tenho algumas pinturas a óleo e algumas páginas de uma HQ que estava lutando para sair da minha cabeça.

E Zac mostrou suas artes novas com dissimulada indiferença.

- Puta merda! Esse tá do caralho! Era assim que o Fat se expressava.

- Tão bom quanto o Bóris!

Era nesses momentos que o trabalho de Zac valia a pena, quando caras como o Fat reconheciam seu talento, não que isso fizesse diferença, ele continuaria a ser um zé ninguém neste disputado nicho, mas o Fat era um cara com discernimento, sabia ver algo de valor.

- Tá melhor que o Frazetta!!!

Claro que não chegava a tanto, mas só ali seu talento era reconhecido. Todo artista gosta de ter o ego massageado e Zac não era imune a isso. Era a razão pela qual ele aturava o Fat e alguns outros pernósticos iguais a ele, que não economizavam elogios.

Depois de muita conversa mole sobre editores picaretas e a luta que era receber uma grana por um trabalho entregue no prazo o Fat foi embora deixando no ar um clima de depressão.

O ar estava gelado e Zac queria fechar os olhos, dormir e se apartar da vida. Tirou a roupa e se enfiou debaixo das cobertas que estavam geladas como uma mortalha. Leva tempo até o calor do corpo irradiar pelos tecidos. Enquanto isso acontecia o sono do esquecimento avizinhava-se timidamente. Foi aí que o telefone tocou. Pôs a cueca, a bermuda e foi atender.

- Alô?

- É com você mesmo que eu queria falar.

- Quem é?

- Aaaah, como é gostoso! Era uma voz feminina, rouca e sensual, ofegante.

- Quem está falando?

- Sua voz é bonita, é grave, máscula. Aposto que você sabe chupar uma buceta como ninguém.

- Faço o que posso.

- Você gosta? 

- Do quê?

- Chupar buceta.

- Se estiver bem lavada...

 - A minha tá toda molhada

- Escuta, isso é alguma brincadeira?

- Não, escolhi este número ao acaso na lista telefônica. Disquei o número e fechei a lista, quando eu desligar não saberei qual é, faço isso sempre.

- Porque você não me dá seu número?

- Não, assim não tem graça. Vai, fala.

- Falar o quê?

- Que gosta da minha bunda, que ela é grande...

- Tua bunda é enorme, suculenta!

- Aaah, que gostoso! Tá de pau duro?

- Pode apostar a vida do teu cachorro.

- Como sabe que eu tenho cachorro?

- Intuição. Não vai me dizer seu nome?

- Não, nada de nomes, sua voz me dá tesão. Tô me masturbando, você está? 

- Não.

- Aposto que teu pau é grande e que gostaria de arregaçar a minha bunda e meter no meu cu. 

- Nem me fale, escute, porque você....

- Fala, fala mais que eu tô quase gozando...

- Você é uma cadela gostosa, uma puta safada....

- Aaaaahhhh...

- Tô te lambendo todinha...

- Aaaahhhh....

Em seguida ela desligou o telefone.  Zac lamentou não ter bina. Número escolhido ao acaso, só com ele mesmo, acertar a mega sena que seria bom de verdade, nada! 

O cansaço e o sono eram maiores que a excitação. Estava quase adormecendo quando ouviu o tilintar das chaves na porta da sala, em seguida o som de sua mãe entrando com as compras. Desistiu de dormir. Levantou, ajudou sua genitora com as sacolas. Ia tomar um banho para sair quando ouviu o telefone tocar, apressou-se em atender achando que poderia ser a mulher da voz rouca de novo. Não era, e sim a fala de seu pai lembrando-lhe da tarefa que tinha para executar.

O banho foi demorado. Ducha quente no clima frio era assim, como bálsamo, você abraça o próprio corpo e fica debaixo do chuveiro como que lavando da alma tudo que julga impuro. Quisera fosse assim tão fácil.

Zac cultivava um cabelo longo que lhe chegava pelo meio das costas. Aparou o cavanhaque, vestiu a camisa, seu jeans surrado e um casaco de lã verde escuro, tênis. Se perfumou e foi até o armário do pai, de lá tirou uma grossa e pesada corrente de ouro, cafona toda a vida, digna de um bicheiro  Colocou no bolso interno da blusa. Beijou a mãe e saiu.

O corredor estava escuro, ao dobrar a direita em direção às escadas as luzes se acenderam automaticamente. O elevador chegou, dentro estava uma uma gorda baixinha, muito bonita de rosto que morava no quinto andar. Tinha uns quadris e bunda paquidérmicos, totalmente desproporcionais ao seu tamanho.

- Uau! Como vai o meu fortão?

- Tô bem, e você?

- Endividada, tem dinheiro pra me dar?

- Quisera eu, também estou precisando.

- E outra coisa, você tem para me dar? Ela se aproximou de forma sedutora, o perfume era gostoso, os olhos muito bonitos.

- Eu teria, se você não fosse casada.

- É isso que gosto em você, um cavalheiro, respeitador. Não se encontra mais. Me diga que me quer eu eu peço o divórcio na hora.

Zac riu. Sabia que aquela mulher tinha um gênio de cão, o marido tinha medo dela. Ele jamais cairia nessa armadilha. 

- Um outro dia terminamos essa conversa, disse ela, saindo na frente dele, rebolando o colossal traseiro.

Um vento gélido, cadavérico, soprava naquela tarde. Morava no centro velho de São Paulo, no lugar que chamavam de cracolândia. Seu irmão que residia em Brasília dizia que o resto da família morava no dente cariado da boca do lixo, e era verdade. Ali se via de tudo: putas, drogados, travestis, traficantes, enfim, toda a escória possível de uma sociedade falida e degradada. Algum boêmio poderia encontrar ali, de forma romântica, matéria prima para alguma canção ou livro. Zac não via dessa forma; este foi o local que seu pai escolheu para residir depois de morar mais de 15 anos em uma bela super quadra no Planalto Central. Zac tinha três irmãos, um continuava na Capital Federal, lutando pela sobrevivência e era mais corajoso que ele, outro fritava os miolos na faculdade de medicina e era muito mais esforçado e o caçula, que devia estar com alguma garota naquele instante, era muito mais autêntico.

Zac era um fracassado, tinha mais de 30 anos e alimentava a ideia de fazer quadrinhos, pintar calendários como Norman Rockwell e ganhar dinheiro, muito dinheiro, para sair daquela vidinha ordinária, dar um bom apartamento para seus pais, produzir um disco com a voz de sua mãe - o grande sonho dela - ajudar os irmãos. Ele queria casar, ter filhos, viver longe da situação vexatória de ser pau mandado do pai. Mas só o que ele fazia era sonhar, por mais que tentasse melhorar suas técnicas artísticas e adentrar no metiê dos que conquistaram algum sucesso, para ele era como enxugar gelo, parecia sempre leva-lo a lugar algum.   

Quando criou um personagem e depois de sete anos conseguiu publicar seu primeiro álbum de quadrinhos, um jornalista da Folha de São Paulo entrou em contato querendo fazer uma matéria sobre a produção nacional. Marcaram um dia e hora e na ocasião foi recebido por um gordo de barba e cabelos longos que mais parecia membro de uma banda de metal rock.

- Gostei muito do seu livro, você é um cara corajoso.

- Obrigado.

- Achei interessante as reflexões do seu personagem sobre vida e morte.

- Bem, então acho que atingi meu objetivo.

- Com certeza.   

Estavam na cantina, no último andar do prédio onde funcionava o jornal, na Barão de Limeira, dali se via boa parte da cidade. Era uma tarde quente, sentaram em uma mesa, o barbudo tomava um refrigerante. 

O fato é que conversaram e conversaram um bom par de horas, falaram sobre Flávio Colin, Shimamoto e todos os mestres das antigas, as adversidades que as HQs tupiniquins enfrentavam por não existir um mercado sólido com produções regulares, boa distribuição e divulgação.

Por fim Zac foi embora satisfeito por mais esta divulgação. Semanas depois a tal matéria saiu na Ilustrada, duas páginas de texto e imagens e não havia uma única referência a seu nome, ao seu personagem ou ao seu livro, fora isso, todo o resto estava lá.

Foi tirado de seus pensamentos pela pessoa que iria encontrar, um amigo de seu pai conhecido como "Professor". Estava ali, parado, a espera, com um jornal dobrado debaixo do braço, o terno era surrado mas a barba branca era bem aparada. Era bebedor e fumava cigarros sem filtro.

- Como vai meu jovem?

- Bem, e o senhor?

Tomaram o metrô em direção ao Jabaquara. Fizeram baldeação na Paraíso em direção à Clínicas.

O cara falava e Zac não ouvia. Dava conselhos, mas a cabeça do rapaz estava em outro planeta, ele só prestou atenção na seguinte frase: 

- ...se não fosse a sabedoria do seu pai, você teria um filho com cada mulher com quem dormiu.

Eles se dirigiram à casa de uma mulher a quem chamaremos de "Poetiza". Zac achava que ela deveria ser alcunhada de "Agiota", pois era disso que se tratava, a mulher ia emprestar dinheiro ao pai de Zac a juros altos, a pulseira ia ficar de garantia e o Professor seria o intermediário da transação.  

Chegaram na casa da poetiza já noite. O apartamento dela mais parecia um museu, Zac apreciou; muitos quadros ornavam todas as paredes, alguns de excelência, muitos objetos bregas também, móveis coloniais, tapeçarias e toda tralha antiga possível. A tal mulher era uma velha bonitona que se vestia de forma extravagante, viúva de um oficial da marinha. Se julgava uma intelectual, tinha publicado diversos livros de poesia. Trajava um vestido azul colado no corpo com uma abertura nas pernas deixando entrever fartas coxas brancas.

Enquanto ela e o Professor conversavam sobre política, o rapaz lia algumas das poesias criadas pela mulher. Nada que se comparasse a Florbela Espanca ou Cecília Meirelles, claro, mas eram sonetos muito bons. Ele recusou bolachas e chá, queria ir para casa tocar seus desenhos, era a única coisa que lhe dava alguma satisfação.  

Deixou a pulseira, pegou o dinheiro e ele e o barbudo ganharam o metrô as 23 horas. Fazia um frio terrível. Ele saltou na estação Luz e o amigo de seu pai seguiu para Santana. Começou a garoar e o vento glacial parecia fúnebre.

Lembrou-se do HQ Mix, a premiação era importante, os criadores ótimas pessoas, mas todo o resto lhe enchia mortalmente o saco. Praticamente todo ano eram os mesmos premiados, nunca havia renovação. Talvez ele fosse mesmo invejoso e não admitia para si mesmo, mas todo aquele papo sobre Jim Lee,  MacFarlene, as artes pasteurizadas focando em heróis fantasiados, lhe embrulhavam o estômago. Os quadrinhos eram muito mais que isso, ele sabia, haviam roteiros geniais e desenhos interessantes, inclusive nos mangás, mas acabavam se perdendo no meio de tanto material medíocre criado por gente presunçosa. A arte, na maioria, careciam de identidade, não pareciam nascer das entranhas como as do Crumb, Moebius, Corben, Eisner ou Flávio Colin. Certamente a música e a literatura sofriam do mesmo mal. As artes estavam fixadas à regras, à um modus operandis que só visavam o lucro imediato. De dar nojo!

Estava decidido: ele ia mandar tudo à merda, esquecer os quadrinhos e coisas relacionadas, ia arrumar um emprego que lhe pagasse um salário fixo todo mês.

Subia a Rua Aurora, à sua frente, um travesti de quase dois metros, canelas finas e uma bunda desmedida que parecia querer estourar o micro vestido apertado, fez-lhe uma proposta sexual numa voz anasalada, ele fingiu  não ouvir e continuou seu caminho perdido em pensamentos até escutar o cantar de pneus ao seu lado e um carro enorme e escuro, de faróis apagados, lhe barrar a passagem. Numa fração de segundos ele entendeu a encrenca que estava por vir. Os homens da lei saltaram do veículo com artilharia pesada em punho.

- Mãos na parede, vagabundo!

O moço obedeceu tendo o cuidado de afastar bem as pernas e assim evitar que os PMs o chutassem por baixo. Foi apalpado nos tornozelos, saco, pernas e costelas, teve cócegas mas não sentiu vontade de rir.  

- Ele tá armado?

- Não.

- Drogas?

- Não.

O policial tirou-lhe a carteira do bolso traseiro e olhou sua identidade.

- Tá fazendo o que na rua a essa hora, cabeludo?

- Estou a caminho de casa.

- Trabalha?

- Sim.

- É sim senhor,

- Sim senhor.

- Faz o quê?

- Sou desenhista.

- Isso não é trabalho. Se ajoelha.

- Como é? Zac estava apavorado mas não ia permitir um abuso desses.

- Se ajoelha, ô cara!

O PM, um negro bem alto, deu lhe um soco de cima para baixo no ombro, pesava como um saco de cimento, mas ele não se dobrou.

- Ajoelha!!! A manzorra desceu de novo como uma marreta. Um outro atrás de si lhe aplicou um "telefone"; ficou zonzo, o ouvido zunia, caiu de joelhos. O que queriam afinal? Se divertir humilhando um coitado qualquer?

- Esse cabeludo é cheio de marra!

Outra viatura menor, também de luzes desligadas estacionou ao lado.

- O que está acontecendo aqui?

- Um folgado, tenente.

- Tá com identidade?

- Tá aqui.

- Você trabalha, rapaz? O oficial era um indivíduo de estatura média, musculoso, com bigodes grisalhos.

- Sim senhor. Zac não reconheceu a própria voz.

- Faz o quê da vida?

- Sou artista plástico, formado como arte educador.

- Ah, é professor de artes?

- Ainda não exerci. No momento faço ilustração para livros didáticos e histórias em quadrinhos.

- Quadrinhos? Como os do Fantasma e do Mandrake?

- Sim senhor, é isto.

- Eu lia muito gibi do Mandrake.

Zac nada disse, é como se ele não existisse no tempo e espaço.

- Tem carteira de trabalho?

- Tenho, mas tá em casa.

- Mora onde?

- Na Rua Guaianazes.

- É perto, venha, vamos te dar uma carona.

O jovem não queria. Temeu que os traficantes da área o tomassem por "ganso" da PM, mas não conseguiu recusar. Entrou na viatura menor. Os veículos seguiram silenciosos pela Rua Aurora, dobraram na Rua Conselheiro Nébias, depois na Rua Vitória até chegar à rua de Zac. 

- É aqui. 

Ele pensou em anotar mentalmente o número da viatura, o horário e fazer uma queixa ao comando geral da polícia militar, mas preferiu esquecer o assunto. Bem, esquecer seria impossível, mas ia deixar daquele jeito.

A localidade estava deserta e escura. O policial que o agrediu falou:

- Tenha uma boa noite.

O desenhista o olhou pela primeira vez no rosto, era um indivíduo jovem com uma boca esquisita, parecia um cu com hemorroidas.

Pernas trêmulas o conduziram ao elevador e dali para seu apartamento. 

Entrou silencioso. Não queria ver ninguém. Precisava de um banho.

O telefone tocou. Quem seria a uma hora daquelas? Atendeu no primeiro toque. Tarde demais, sua mãe surgia de seu quarto com o rosto amarrotado de sono informando que havia deixado seu jantar na geladeira. Agradeceu e respondeu à ligação:

- Alô? Sua voz verdadeira tinha voltado.

- Alô, eu queria falar com o Zac.

- Já está falando

- Zac? Desculpe o adiantado da hora, mas eu estive esta noite na premiação do HQ Mix e não te vi por lá, conheço um amigo seu, o Fat, ele me deu seu número.

- Sim?

- Bem, olhe eu comprei o seu livro, foi uma das melhores coisas que li nos últimos anos. Você é sensacional!

- Obrigado.

- Veja, eu estou roteirizando uma estória e queria saber se você poderia desenhá-la. Se passa no século passado, na França, é sobre um vampiro...

- Escute, desculpe, mas o momento não é bom, me ligue uma outra hora, então conversamos, pode ser?

- C-claro, desculpe. Te ligo amanhã, então.

- Certo.

- Boa noite.

- Boa noite.

Zac entregou o dinheiro da agiota para sua mãe dar a seu pai. Agradeceu a Deus a polícia não ter percebido todas aquelas notas em seu bolso, poderia ter sido uma dura provação.

Foi ao banheiro. Despiu-se

Parecia estar num freezer. Regulou o chuveiro na temperatura certa e ficou debaixo d´água abraçado ao próprio corpo. Quis chorar mas agora já era muito tarde para isso.

A noite parecia não ter fim, mas para ele não fazia qualquer diferença.


 

quarta-feira, 28 de julho de 2021

FINALMENTE O ANATOMIA DE SERES FANTÁSTICOS CHEGOU!!!!!!


 Pronto, recebi sinal verde do editor para falar sobre um álbum que tenho muito orgulho de ter elaborado. Claro, claro, sou suspeitíssimo para falar, a coisa que mais gosto de desenhar são criaturas de fantasia (não por acaso meu personagem de quadrinhos é um felino antropomorfo), principalmente monstros e de preferência, GIGANTES. 

Pois bem, Desenhando Anatomia - Seres Fantásticos pela Editora Criativo é sobre isso, monstros, gigantes, híbridos, alienígenas e tudo o que a minha mente imaginativa pode conceber. Claro que havia muito mais para mostrar mas eu estava limitado ao número de umas noventa e tantas páginas, muita coisa bacana ficou de fora, algumas não passaram dos esboços (nem sei em que envelope eu os guardei, são tantos desenhos...!) e outras ainda só ficaram em meus pensamentos. Mas o que está registrado no livro creio que vale a pena, pra quem, como eu, curte uma boa fantasia, bem entendido. 

O livro estava pronto desde muito tempo - nem sei mais quantos anos - e ficou na geladeira da editora aguardando o momento certo de sair. Finalmente!

Nele eu falo da minha relação com os monstros e os gigantes e dou umas dicas de como criar um ser fantástico, torná-lo crível, funcional. Acima de tudo busco aguçar a imaginação do leitor (não curto muito a palavra aluno, não me acho professor de nada, apenas uma pessoa que aponta um caminho), mostrar que qualquer um que maneja bem um lápis pode dar origem a estes seres que nos encantam e nos assustam. 

E mesmo os que não desenham mas gostam dos meus traços, tem umas ilustrações bem legais, falo sem modéstia. Foram dez livros que lancei pela Criativo (sem contar o Caderno de Exercícios) e este ao lado do Sketchbook são os meus preferidos. Ele pode ser adquirido através deste link:

https://www.livrariacriativo.com.br/produto/481511/desenhando-anatomia-seres-fantasticos?fbclid=IwAR1M4slQsjHOZeiVP_XL1tbv9ZoiBFmqmh4jYWPTu4CamfoeVUuxQgsKNZc


Bom, esse deve ser meu último tomo que sai por essa editora, não há planos de editar mais nenhum. O futuro dirá o que vem pela frente.

Beijos a todos.



sábado, 24 de julho de 2021

RELEMBRANDO GRAPHIC PADA ESPECIAL ZÉ GATÃO.


 Zé Gatão nunca teve uma casa fixa. Vejo certos personagens, como Asterix por exemplo, serem publicados por uma editora por anos a fio. Eu julguei que a Via Lettera editaria meus álbuns a medida que eles fossem ficando prontos, bem, esse era o meu desejo, mas sim, não fui campeão de vendas e os publishers, claro, não são mecenas, não têm nenhuma obrigação comigo ou qualquer outro autor. Isso demonstra também a fragilidade do mercado de HQs nacionais, mas não é disso que trataremos aqui. 

No ano de 2010 eu decidi retirar dos envelopes algumas histórias curtas que ia criando ao longo dos anos nos intervalos dos pagalugueis e oferecer a alguma editora pequena ou fanzine, sei lá. Uns tempos antes travei contato com um pessoal de Belém do Pará que formatavam uma revista chamada Quadrinorte. Foi combinado que uma das minhas HQS sairia na número 2, inclusive cedi uma ilustração colorida do felino para a capa. Bem, pra encurtar, houve um desentendimento entre os organizadores e a Quadrinorte foi definitivamente cancelada, não passou da número1, parece. Acreditem, é normal isso acontecer comigo.      

 Memento Mori e Daqui Para a Eternidade já estavam prontos desde 2003 mas não tinha a menor ideia de onde eu publicaria e nem estava mais pensando no assunto, mas a intenção de trazer ao público alguma das curtas ficou na cabeça. O amigão Nestablo Ramos tinha aparecido na Prismarte, uma revista feita na raça por uns artistas de Recife. Procurei o roteirista Leonardo Santana (por onde será que ele anda?) e propus ceder uma HQ do Zé Gatão para a Prismarte, só para ressuscitar o personagem. Ele levou a ideia para os outros membros da PADA e retornou com a novidade de lançar um álbum completo com as narrativas curtas do Felino, afinal, segundo ele, todos lá eram fãs do Gato. 

O plano era que a Graphic Pada fosse uma publicação periódica, sempre com um tema ou personagem de cada vez e o felino cinzento seria o primeiro. Infelizmente não foi assim, até onde sei só saiu Zé Gatão mesmo.

Foram editados apenas uns poucos exemplares, não sei o número exato mas certamente não chegaram a 100. Acabou muito rápido! De vez em quando o Milson Marins imprime mais alguns para vender nos eventos, mas é um material que poucos possuem. 

O Leonardo Santana teve a coragem de tentar um financiamento coletivo no Catarse para lançar uma edição mais caprichada. Não tive envolvimento direto por não ter tempo para fazer campanha, mas ele se empenhou. Entretanto, para provar que o personagem nunca foi popular, a meta não foi atingida e o gibi PADA permanece sendo o mais difícil de conseguir.  

Tenho orgulho desse álbum, é modesto mas as histórias, que fogem um pouco do padrão normal, são contundentes e divertidas, mas eu sou suspeito para falar, é lógico.

domingo, 18 de julho de 2021

ESPERANÇA, INGRATIDÃO E PROJETOS EM ANDAMENTO.


 Boa noite!

Um novo livro meu já  está na praça, demorou, como demoram todos, é um tomo que gostei muito de fazer e que foi questionado pelo editor várias vezes, tenho orgulho que abordei e desenhei ali, entretanto melhor não falar mais que essas palavras, o publisher, me pediu para não divulgar até que ele me diga que posso, consta lá, no site da editora, mas não recebi dele nenhum aviso e quero evitar problemas, mas assim que tiver carta branca comentarei sobre ele aqui.

Vivi a minha vida inteira sem saber o que fazer com ela, procurando atinar de que maneira eu poderia ser útil, imagino que todos tenham uma função nesta terra. Escolhi trilhar o caminho do bem tanto quanto fosse possível, se eu fizesse mal a alguém (e eu já fiz muito) não seria intencional. É uma escolha difícil. Uma vez, um rapaz me disse numa certa mensagem sobre um jogo (ele curtia muito videogames) onde você podia optar por dois caminhos, o do bem e o do mal, o caminho correto era muito mais cheio de obstáculos que o caminho torto. Eu digo que na existência, a estrada direita é mais sofrida porque pela lógica se entranharmos o bem, recebemos o bem, da mesma forma que se plantarmos maçãs, colhemos maças, pela minha experiência não é assim na jornada dos seres humanos - na maior parte. Ingratidão é uma coisa que dói, mesmo sabendo que nunca devo esperar dos outros a atitude que tenho com elas, tenho convivido com o desagradecimento todos os dias agora que vou entrando na velhice, eu  deveria estar acostumado, na verdade nem me importaria se esta atitude - praticada por uma única pessoa - não tivesse por vezes consequências mais sérias. A minha sensação é de que uma arma está diuturnamente apontada para minha cabeça e a qualquer momento o gatilho vai ser acionado.

Essas situações de pressão constante, sinto, tem cobrado uma certa urgência em produzir, em fazer a minha arte crescer. Crescer no sentido, talvez não da técnica, mas na rapidez da execução. As duas HQs que desenho atualmente (alternadamente) ambiciono que sejam o melhor que posso fazer em termos de traços. Pelo menos tento. São projetos que ainda vão demorar um bocado para chegar ao público, pois eu só tenho uma mão direita para executar, os roteiristas são corajosos e tiram dinheiro de onde não tem para me pagar, aí já viu, né? As imagens que vemos hoje fazem parte dessas obras ainda em andamento.

Passei noventa e nove por cento das minhas estações correndo atrás do dinheiro e ele sempre foi mais rápido do que eu; jamais foi minha ambição ficar rico - ou famoso - hoje a única coisa que ainda sonho neste vale de lágrimas é comprar uma casa (ou apartamento), não tanto por mim, mas pela Verônica. Mas anelei um dia em ter muito dinheiro, para ajudar minha família, para realizar as aspirações de alguém e para abrir uma editora, com ela eu traria um bocado de gibi gringo para cá e também publicaria os trabalhos da turma que admiro, como Allan Alex, Nestablo Ramos e vários outros. Pagaria uma bela grana para o Arthur Garcia terminar sua Piratininga, republicaria em álbuns de luxo material do Flávio Colin, Júlio Shimamoto, Mozart Couto e doaria boa parte para bibliotecas. E se tudo isso não desse retorno, sem problema, dinheiro é para ser usado em algo que traga satisfação, pelo menos eu acho que deveria ser. Sonhos. Apenas quimeras. 

Quadrinhos deve ser algo que dá algum dinheiro, sim. Vejo um bocado de pequenas editoras colocando na praça um material bacanudo, com bom papel, capa dura e tudo mais vindos da Europa e Japão. Tudo bem, é numa tiragem baixa, mas mesmo assim se a coisa não rolasse não seria possível. A internet ajuda, as plataformas de financiamento coletivo idem, imprimir hoje é muito mais simples do que na época que surgiu meu primeiro Zé Gatão. Apesar de tudo, o mercado para o produto nacional ainda não decola, salvo uma ou outra exceção, o que me impede de ser otimista em relação às minhas criações pessoais que estão esperando na gaveta. Bueno, já falei zilhões de vezes sobre isso e não vou repetir a cantinela.  

Grato a todos vocês por perderem um tempinho do seu dia (ou noite) para ler meus desabafos.

Fiquem bem.  



domingo, 11 de julho de 2021

O VAZIO DE CADA UM.

 Ok, vamos fazer isso, vamos escrever, manter este blog atualizado o mínimo que possa. Não me sinto obrigado, mas é uma questão de respeito a quem vem aqui esperando alguma novidade. Não há inovações, apenas diante de mim uma estrada deserta, daquelas que nunca verei, que existem nos filmes, com cactus, tweeds e placas meio caídas, com montanhas bem ao longe. Sigo por esta via a muito tempo, mesmo quando tem um bocado de gente à minha volta ela continua despovoada, a diferença é que antes o horizonte me era indecifrável, hoje tudo está claro, não consigo ver onde ela vai dar, mas sei como vai terminar. Não, não falo da morte, isso seria muito óbvio, falo que quando você planeja, ambiciona, tenta imaginar o que está depois daquela curva, você projeta coisas e acaba frustrado. Agora sei claramente o que vem a seguir. Não exatamente qual a surpresa, lógico, não sou vidente, tem sempre uma armadilha nova, o que mudou hoje é que isso na verdade não importa. Não depois de sofrer as perdas que sofri. Sim, eu sei, o tempo vai secar a ferida e restará uma feia cicatriz que sempre vai me recordar o que se foi (e nunca mais voltará). É seguir em frente, trabalhando, dando meu melhor tanto quanto seja possível até o dia derradeiro. Há uma pessoa bem próxima de mim que só pensa o pior dos outros e cujo o ideal é fazer alguém sofrer muito um dia, uma espécie de vingança por algo que ela nem sabe dizer exatamente a razão. Eu não sou assim, curto muito alguns escritores malditos, beberrões e boêmios que sentem raiva de tudo, do amor que nunca receberam - me identifico um pouco com eles, acho até graça da maneira despojada e irônica com que narram suas histórias ou falam sobre suas vidas - porém não culpo Deus por minhas desditas, nem ninguém, se existe um culpado sou eu mesmo que sempre agi de forma muito sentimental. Contudo meu intento é jamais fazer mal ou desejar o mal de forma deliberada a quem quer que seja. Minhas frustrações e amarguras eu despejo tudo nas histórias que desenho, ali eu deixo que as emoções fluam, que ganhem corpo, que façam a festa. Aliás, não fazem o mesmo os tais escritores dos quais gosto?

Tenho passado esses dias à base de Ibuprofeno, tudo por culpa de um dente há muito condenado. Ele até que durou bastante. Faz um bocado de tempo (tempo mesmo) quando fiz meu último check up, a dentista disse que este dente iria cair, sem cárie, nem nada, bonzinho, culpa do maldito tártaro. "mas eu escovo bem os dentes, doutora", eu disse, "sim, acredito, mas deveria ter feito profilaxia de tempos em tempos para evitar isso", ela respondeu, "mas não vamos mexer nele agora - ela completou - ele pode durar um mês ou alguns anos, veremos". E nunca mais quis pensar no assunto (detesto sentar na cadeira do dentista), até que nesses tempos amargos ele começou a  doer, não uma dor louca, mas aquela que te lembra que você tem um rosto, uma face que dá a impressão de estar inchada sem estar. O desconforto é grande. Não ando com muito dinheiro, estamos tentando economizar, este mês sai o último pagamento por um dos quadrinhos que realizo atualmente e depois dele não sei se terei algum trampo remunerado para pagar meu aluguel e boletos. Mas terei que colocar as mãos no bolso e extrair esse dente, a menos que tenham desenvolvido algum tratamento milagroso que possam salva-lo. Até lá, vamos de analgésicos que podem comprometer meus rins no futuro.

Continuo criando duas HQs ao mesmo tempo, alterno os dias para cada uma. "Rastreadores" (nome provisório) já tem todos os sketches de páginas prontos e aprovados. Agora usar a mesa de luz para dar os traços  definitivos e finalizar a nanquim. "O Morto" (título também momentâneo) será mais longa, mas já vou finalizando. Botei na minha cabeça que quero que artisticamente esses dois projetos sejam pequenas obras primas - mesmo sabendo que é muita pretensão da minha parte - pois sempre penso que podem ser as últimas graphic novels que faço na vida. Bem, quanto a isso, veremos.

Acho que é isso por hora.

Ainda nenhuma notícia sobre Zé Gatão - Siroco.


 

sábado, 26 de junho de 2021

A SEMANA IMPRODUTIVA.

 Ai, ai.

Esta foi uma semana escrota, é, a palavra certa é essa, ESCROTA! Sinceramente, não quero ser mal agradecido a Deus, tenho trabalho no momento, que é fazer quadrinhos (bem, há quem ache que isso não é trabalho, e há pessoas que nem sabem o que é quadrinhos, ou que exista quem os faça. Conheci uma senhora, certa vez, que pensava que os  desenhos, as letras, os balões de fala e tals, das HQs, eram criadas por uma máquina, algo assim) e isto permite que eu more num lugar decente e faça mais de três refeições ao dia, mas certas situações poderiam ser evitadas.....mas não vamos tocar nos assuntos caseiros do dia a dia, foquemos um pouco na minha saúde (ou falta dela). Na segunda feira me dirigi a uma clínica para fazer uns exames solicitados pelo urologista, sofro de HBP (uma merda que ataca homens desafortunados normalmente depois dos 40), cheguei cedo no local em jejum para o exame de sangue. Até aí, tranquilo, o problema foi na hora de realizar o ultrassom do abdome, para isto é necessário tomar vários copos de água até a bexiga estar bem cheia. Não é lá muito legal beber água sem estar com sede, mas ok, vamos lá. Fui bebendo um copo atrás do outro enquanto eu era obrigado a ver a Ana Maria Braga na Rede Globo falando sobre o serial killer de Goiás que faz a polícia de idiota. Num momento senti a bexiga cheia e uma baita vontade de mijar. Bati na porta da médica e perguntei se demoraria muito para ser atendido: tem umas 14 pessoas na sua frente, senhor, fora os preferenciais. Puta merda, pensei. Mas, olha, eu estou bem apertado aqui. Aconselho o senhor a esperar. Esperei, mas o incômodo se agigantava e eu disse a mim mesmo: Foda se! E fui  ao banheiro. A urina saiu num jato fraco. Voltei para a sala de espera e lá estavam todas aquelas pessoas lascadas, velhas, gordas, pessoas como eu, na verdade.....uma menina cuja mãe não conseguia controlar corria pelo local fazendo uma zoada do cacete, todos ou mexendo no celular ou ouvindo a apresentadora, que se negava a envelhecer, discorrendo sobre um assassino. E minha bexiga ainda cheia. Um cara falastrão, do tipo que reclama de tudo, uma cara alto, com uma barriga grande e feia alugava meus ouvidos, falando mal do governo, do clima, dos médicos, dos preços caros das coisas, de tudo enfim, só aumentava o meu martírio, pra fugir dele, voltei ao banheiro e só expeli um pequeno filete de mijo. Isso não é boa coisa, já me aconteceu antes, refleti. Nessas ocasiões precisei baixar na emergência do hospital para extrair a urina via sonda. Eu não conseguia mais ficar parado, minha agonia era crescente. Sentar, impossível, pressionava demais a bexiga. Depois de várias idas ao banheiro para excretar só umas gotas, num tempo que me pareceu séculos de sofrimento, fui atendido. A médica era uma bela senhora jovem, muito educada, que me pediu para baixar as calças até que meus pentelhos ficassem visíveis e com muito esforço me deitei numa maca. Está doendo muito seu Eduardo? Nem precisei responder, minha expressão de agonia dizia tudo. Ela espalhou gel sobre minha barriga e procedeu como fazem com as grávidas. Nossa, sua bexiga está muito distendida!!! E continuou fornecendo dados à uma mocinha que digitava tudo. Sua próstata está bem crescida seu Eduardo! Diga algo que eu não saiba, pensei. Me deu papel toalha para eu limpar o gel e  me pediu para esvaziar ao máximo a bexiga para ela relatar a pós micção. Olha, não sei se vou conseguir, eu disse. Tente, ela falou. Tentei, mas só saíam gotas sofridas.                                                                   

Não levei o celular e eu tinha que avisar a Verônica. Procurei um telefone por ali e não havia nenhum. Os smartphones acabaram com a possibilidade de procurar socorro se você fosse pobre. O barrigudo reclamão me ofereceu o celular dele, agradeci e avisei a Vera sobre meu estado. Ela já sabia o que eu teria que fazer, "vou preparar suas coisas". O cara do celular continuou a falar mal da vida, da demora, da justiça, da mulher dele e da falência de tudo. Pedi licença e voltei ao banheiro na esperança de mijar mais um pouco e me livrar daquela agonia mesmo sabendo que não seria possível. Só umas três gotas. Ahhh, porra!                                                                                                                               

Bati na sala da médica e me desculpei mas não conseguia mictar, perguntei se ela não teria uma sonda por ali. Ela disse que não podia realizar esse procedimento. Bem, então terei que fazer eu mesmo. Ela me deu o resultado do ultrassom e eu fui embora. Eu já andava encurvado. Parecia que alguma coisa dentro de mim ia se romper a qualquer momento. Peguei o ônibus e mesmo havendo vários lugares viajei em pé, um calor do caralho! Maldizia tudo que era sinal em que o veículo parava ou um buraco na pista onde ele sacolejava. Sentia que uma pancada por mais leve que fosse romperia minha bexiga. Minhas vias urinárias estavam comprimidas pela próstata avolumada mais que o normal, culpa do excesso de água. Desci do ônibus contando os passos debaixo de um sol furibundo, eram umas 14 horas.  A última vez que me via naquela situação foi no funeral da minha mãe. Meu irmão André, que é médico comprou um kit de emergência para essas situações e me ensinou como fazer para não ter que ir a pronto socorro. Me apertou o coração lembrar que minha mãe tinha partido e o Gil ainda estava conosco.                                                                                                                                             

Cheguei em casa, Vera me esperava. Tá tudo lá, ela disse. Lavei bem as mãos. Entrei no quarto, me despi, passei álcool nas mãos. Peguei a sonda de número 8, embebi na xilocaína e introduzi na uretra, senti a aflição de ter algo me invadindo. Nada da urina sair!!!! Comecei a me desesperar. Retirei a sonda. Peguei a de número 10, repeti o procedimento. Que coisa horrível! Introduzi até o limite do pequeno cano de borracha e o líquido começou a jorrar. O alívio foi imediato, durou um tempão! Retirei a sonda e fui ao banheiro. Tomei um banho e finalmente fui comer algo. Talvez pelo jejum prolongado a comida me enjoou um pouco. Senti uma fraqueza mortal e fui me  deitar. Quando comecei a cochilar fui desperto por angustiante vontade de mijar. Fui ao banheiro com temor, mas a urina saiu numa boa, mas aquilo se repetiu umas cinco vezes seguidas. Depois tudo normalizou, mas deixou meus membros cansados e uma bela dor de cabeça. Os dia subsequentes foram de obrigações na casa, na rua e uma grande indisposição mental que roubaram todas as energias para as artes. Vera se vacinou num dia de fortes chuvas e os problemas com a bomba d´água voltaram. 

Choro um pouco todos os dias pela ausência de mamãe e Gil e me pergunto se ainda vou ficara muito tempo por aqui. Meu trabalho prossegue, felizmente, é meu lenitivo. Converso com meus outros dois irmãos e me sinto cada dia mais alienígena. 

O que relatei acima só confirma que terei que fazer uma cirurgia em breve, mas para tudo precisa se de dinheiro e o pouco que tenho é muito suado. Não posso fazer pelo SUS. Vamos ver.

E é isso.

Arte para um clássico da literatura brasileira.


A SAUDADE É MAIS PRESENTE QUE NUNCA

   No momento que escrevo essas palavras são por volta das 21h do dia 21 de abril. Hoje fazem três anos que o Gil partiu, adensando as sombr...