sábado, 2 de março de 2019
REFLEXÕES SOBRE ANGUSTIA, MEDO E MORTE ( PARTE DOIS DE TRÊS ).
JÁ FAZ UM TEMPO QUE MINHA MENTE FERVILHA PARA CONTINUAR A ESCREVER AS DESVENTURAS DO DESENHISTA ED PALUMBO. COMO PODEM INTUIR, TUDO A RESPEITO DELE É BASEADO EM EXPERIÊNCIAS QUE VIVI AO LONGO DO QUE PODEMOS CHAMAR DE "MINHA CARREIRA DE ILUSTRADOR". SERIAM TRÊS CONTOS, CADA QUAL COM UM FINAL DISTINTO E TRÁGICO. ESTA PARTE DOIS COMEÇOU A FICAR MUITO EXTENSA E OS VÁRIOS PROBLEMAS QUE ANDAM ME ACOMETENDO ME IMPEDEM DE ME DEDICAR A ELA COMO GOSTARIA, E TAMBÉM, PENSO, FICARIA MUITO LONGO PARA VOCÊS LEITORES, ENTÃO ME OBRIGO (MUITO A CONTRA GOSTO) A DIVIDI-LA EM DUAS PARTES. PRETENDO CONTINUAR ESTA SAGA ASSIM QUE PUDER.
Reflexões Sobre Angústia, Medo e Morte (parte Dois De Três).
PRIMEIRO ATO.
Tudo isto aconteceu quando o desenhista Ed Palumbo estava prestes a completar 50 anos. Os ventos frios da grande cidade não lhe sopravam bons augúrios, antes, traziam os odores de desalento e fracasso. As contas não paravam de chegar e os trabalhos fugiam dele como se ele fosse um maldito cobrador. Cansado de andar de ônibus e metrô, batendo na porta de todas as editoras que ele conhecia, com seu enorme portfólio debaixo dos braços, ele decidiu aceitar o convite do Prattes, um amigo, para tentar a vida na famosa cidade litorânea, batizada de "maravilhosa".
"- Cara, tu é um artista do caralho! Deixe essa cidade fria e cinzenta e venha passar um tempo comigo, procure emprego por aqui, mude de ares, eu te ajudo, pelo menos teto e comida não vão te faltar. Será uma honra hospedar um dos meus ídolos em casa, ela é modesta, mas é sua também!"
O ilustrador nunca gostou de ser pesado a ninguém, mas um tanto constrangido, resolveu se mudar. Combinou tudo certinho com Prattes, vendeu, a preço de banana, seus muitos livros de artes e gibis raros num sebo, quitou o aluguel, entregou o minúsculo apê que mantinha na "boca do lixo", rapou suas minguadas economias, comprou uma passagem e lá foi, na esperança de finalmente ser contratado por uma empresa que assinasse sua carteira afim de que ele pudesse ter uma aposentadoria e envelhecer com mais tranquilidade. O tempo de ser ambicioso, sonhar com grandes feitos e fama haviam passado.
Tinha com ele apenas uma pequena mala com poucas roupas e uma pasta emborrachada contendo seus melhores desenhos e pinturas.
Foi uma viagem noturna exaustiva, ele estava do lado da janela, um gordo, cheirando a pano mofado, sentado ao seu lado, o pressionava, devia estar morto de cansaço, a cabeça pendia como se não estivesse conectada ao corpo, babava e roncava sonoramente. Uma mulher loura oxigenada e alta andava pelo corredor do veículo cochichando nos ouvidos de alguns homens, alguns se levantavam e iam com ela para os fundos do carro, ouvia-se barulhos discretos de estalo de língua.
Palumbo cochilou algumas vezes, mas despertava sempre com a bexiga cheia, prestes a estourar. Com certa dificuldade, acordou o imenso companheiro de viagem, que fazia um sacrifício enorme para se levantar e ceder passagem.
- Escute, para não incomodá-lo, você não quer dormir próximo á janela? Perguntou ele?
- Porra nenhuma, cara, só viajo no corredor! Respondeu o gordo fedido com ar de irritação.
- Ok!
Quando caminhou para o banheiro a mulher alta veio em sua direção. A enorme cabeça loira, de um perfume adocicado, bafejou em suas orelhas: "benzinho, eu chupo seu pau bem gostoso até cê gozar, por 10 pratas."
- Desculpe, coração, mas estou liso.
- Vai tomar no cu, sua bichona! E se afastou. Só então Palumbo notou que se tratava de um travesti.
Ele nem estranhou que este tipo de coisa ocorresse num ônibus interestadual, hoje acontecia de tudo.
Entrou no reservado e urinou com prazer, mas pouco, perto do que parecia ser. Aquilo não era natural, nos últimos tempos acontecia com muita frequência, precisava, urgente, se consultar com um urologista. Mas não podia ser pelo Sistema Único de Saúde, aquilo não funcionava, pelo menos, não certas especialidades.
Chegou na rodoviária com atraso, perto de seis da manhã. Teve certa fome e foi até uma lanchonete que tinha na estação.
- Por favor, meu amigo, poderia me fazer um misto quente e um suco natural de laranja?
- Nah, a chapa tá bichada e a laranja acabou!
- Ora essa, tem algum outro lugar onde se comer por aqui?
- Procura, ô coroa, não sou guia turístico!
Com essa, Ed desistiu de se alimentar e foi até um ponto à cata de um ônibus que o deixasse na casa de Prattes.
Ao sair com a multidão da rodoviária, vários homens, de todas as idades perguntavam:
- Táxi?
- Vai um táxi aí doutor?
- Lotação? Temos os melhores preços.
Ignorando, Palumbo foi até um PM negro e grande como uma casa e pediu informação. Era um pouco complicado, teria que pegar três ônibus, mas ele chegaria.
Três horas e três ônibus depois, sob um sol escaldante, Palumbo finalmente chegou até o endereço dado pelo amigo. O apartamento ficava na parte superior de uma farmácia, a porta velha e descascada que ficava ao lado do estabelecimento estava cerrada. Após vários toques da campainha o desenhista, sem que fosse atendido, começou achar que o endereço poderia estar errado. Foi até à farmácia e viu do outro lado do balcão um homem de baixa estatura, cabeça grande, com um nariz parrudo, que devia compor setenta por cento do seu rosto, os olhos miúdos pareciam ainda menores repousados sobre o imenso nasal, abaixo dele um bigode grisalho que escondia o lábio superior.
- Pois não?
Ed pousou sua malinha e sua pasta de desenhos no chão, apoiados ao balcão
- O senhor conheceria por acaso um cara chamado Prattes?
- Prattes? Claro! Gente muito boa, morava em cima da minha farmácia.
- Morava? Sabe se ele saiu? Cheguei de viagem e ele deveria estar me esperando. Toquei a campainha várias vezes, ela deve estar com defeito.
- Meu caro, o Prattes teve um problema....
- Problema? Como assim?
- Bem, não sei se devo falar....não gosto de me meter em assunto alheio....
- Olhe, desculpe, mas não sei se me fiz entender, eu vim de mala e cuia de outro estado e deveria ser recebido pelo Prattes, que problema ele teve? Doença? O que houve afinal?
- Ele teve uma briga feia com a namorada, não quero fofocar mas ele descobriu que ela o traía com um garoto de 18 anos.
- Como é?!?
- Isso mesmo, foi ontem a noite. Foi uma baixaria só. Teve até polícia! Vi quando ele pegou as malas e saiu furioso.
- Poxa...é mesmo? Ele deixou algum telefone, endereço?
- Não sei nada. O garoto que a namorada dele tava saindo é do tipo barra pesada, aquela mulher não sabe no que está se metendo.
- Poxa....que merda!
Palumbo sentiu uma espécie de vertigem, talvez fosse o calor, talvez fosse a decepção. Ele se sentiu enganado, ignorado, jogado num canto qualquer como um trapo imundo.
- Escuta, amigo, tem certeza que ele não deixou um telefone para eu localizá-lo? Ele sabia que eu viria. Acertamos isso.
- Sinto. Nada! Espere, um cliente, finalmente!
O cabeçudo foi atender uma senhora, Ed olhou em volta; nas prateleiras do estabelecimento havia poucos medicamentos, algumas fraldas descartáveis, produtos de higiene e mais nada. O baixinho narigudo devia estar passando por uma crise. Mas nada que se comparasse às suas dificuldades. Com pouca grana e sem um lugar para morar o que ele ia fazer? Uma angústia começou a apertar sua garganta com mão cadavérica, um cansaço desumano o abraçou com sanha.
O baixinho vendeu um envelope de aspirina a uma senhora e o encarou com olhinhos curiosos. Ed perguntou:
- Por favor, como é o seu nome?
- O meu?
- Sim, o seu.
- Milton.
- Poderia, por favor, me dar um copo de água, Milton?
- Claro, mas a água do filtro acabou. Pode ser da torneira?
- Claro, pode sim.
O homenzinho foi até uma salinha, provavelmente onde se tomam as injeções, sempre olhando para ele, talvez temesse que ele roubasse alguma das poucas coisas existentes ali e voltou com um copo médio de vidro, desses de geleia, com água.
Bebeu sofregamente. A tontura se intensificou.
- Poderia me dar outro?
- Pois não.
Mesmo procedimento.
- Escute, Milton, como pode notar, estou numa merda de fazer inveja a um norte coreano, poderia me indicar alguma pensão por aqui? Alguma que não cobre tão caro?
- Não há pensões neste bairro, sinto muito. Mas....bem, se você é mesmo amigo do Prattes, então deve ser de confiança, se quer um lugar para ficar por uns dias eu tenho um quartinho ali nos fundos da farmácia e um banheiro ao lado, só não tem chuveiro. Fecho a loja as nove horas em ponto e abro as sete da manhã, portanto na hora de fechar você deve estar aqui.
- E quanto isso me custaria?
- Cinquenta reais por dia.
- Bem, o que eu tenho aqui deve dar para ficar por uma semana.
- Coloque mais cinco e eu te dou o almoço. Minha patroa cozinha muito bem, peço a ela para fazer uma marmita reforçada para você todo dia.
- Combinado. Posso ver o tal quartinho? Ed mal podia esperar para se deitar e ficar a sós com sua comiseração.
- Claro, vamos lá.
O tal lugar era lúgubre, pequeno e cheirava a formol, umidade. Só tinha uma cama com umas caixas sustentando uma das pernas. O colchão era velho e cheio de manchas. Decerto, se falasse, relataria anos de fodas homéricas.
- Como pode ver, não tem travesseiro nem lençol, mas trago amanhã cedo, eu nunca imaginei que fosse alugar este quarto para alguém.
- Tudo bem, isso até combina comigo. Mas, se não há chuveiro, como posso tomar banho?
- Bem, terá que pegar água de uma torneira que há no pátio aqui, colocar naquele balde, usar essa metade de garrafa pet para se banhar, sabonete e xampu tem na farmácia.
Ed olhou um pequeno pátio que era o fundo do estabelecimento. Altos muros com cacos de vidro guarneciam o lugar. Uns gatos dormiam preguiçosamente no chão cheios de garrafas vazias, caixas, ampolas e frascos de injeções usados.
Ok, disse Ed, tudo bem. Você tem algo para comer aqui?
- Não, minha mulher já trouxe o almoço e eu comi tudo. Mas você pode fazer uma boa refeição barata no Teófilo, fica na esquina descendo a rua. Amanhã minha mulher trás o almoço para nós dois. A propósito, qual o seu nome?
- Ed Palumbo.
- Prazer! Milton estendia sua mão. Era um aperto de mão forte. O desenhista viu isso como um bom sinal.
Palumbo comeu, voltou, Milton fazia palavras cruzadas, ninguém parecia saber da existência daquela farmácia. O banheiro era imundo, fedia a mijo com um poder sem igual, o fundo da privada era mais preto que o destino de algumas crianças indígenas. A descarga não funcionava, teria que usar o balde. Urinou com dificuldade. Lavou como pode o banheiro para poder se higienizar. Tomou banho sentindo a frieza da água devolver-lhe parte das forças. Estendeu sua toalha sobre o colchão imundo e deitou-se fazendo cara de nojo, mas não podia se dar ao luxo de ter escrúpulos. Em vista de tudo o que aconteceu, este muquifo tétrico até que lhe pareceu um quarto de hotel em Dubai. Exausto, não tardou a pegar no sono.
Ele acordou repentinamente ao som de uma porta de ferro sendo abaixada, decerto era o Milton indo embora, se ele fosse pontual então deviam ser nove horas. Cedo. Usando algumas de suas roupas para apoiar a cabeça, virou de lado e continuou a dormir. Teve um sonho estranho, estava num território maléfico onde almas perdidas gemiam clamando perdão por inúmeros pecados. O lugar era úmido e cheirava a formol, com seus pés presos num lodo fedorento, Palumbo despertou molhado de suor. Por um instante não conseguiu se localizar no escuro, tampouco sabia onde estava, segundos depois veio à memória o sumiço do Prattes e o quarto da farmácia. Ficou no escuro com a garganta seca, ansiando por um pouco de água e com uma louca vontade de mijar. Um ruído estranho, quase imperceptível se fazia ouvir. Um som como pequenas arranhaduras na parede. Levantou-se e tateou procurando o interruptor. Acendeu a luz e divisou inúmeras baratas nas paredes e no teto alto. Ficou paralisado um tempo vendo os asquerosos insetos caminharem apressadamente sobre a superfície manchada de umidade, logo se esconderam nas frestas. "Porra! Nem fodendo que volto a dormir com esses bichos imundos ao meu redor!"
Saiu do aposento e um golpe de ar frio lambeu sua pele suada. Apesar da idade e todas as suas desditas Ed Palumbo tinha boa compleição, musculatura privilegiada e magra. No banheiro, também infestado de baratas, a ereção noturna foi cedendo e o desenhista urinou como se a cada jato expelido, a vida voltasse a ele. Depois bebeu água da torneira com prazer inigualável. Os felinos estava agitados no escuro, mas a luz da lua minguante mostrava um enorme gato malhado, de orelha decepada, devorando o pescoço de uma grande ratazana. O bichano o fitou desconfiado, boca cheia de sangue e os olhos como tochas. "Esse é o meu garoto!" Pensou Ed.
Voltou ao quarto. Só se via as antenas dos rastejantes nas frestas das paredes. Consultou seu relógio e marcava 3 e 40 da madrugada. Olhou em volta de si e não pode deixar de pensar que sua situação era parecida com a do Raskolnikov, personagem de Dostoievski em Crime e Castigo. Teorias apontam que o ambiente sórdido em que o jovem vivia, embora fosse um intelectual, exercia influência negativa em seu comportamento.
Receoso em apagar a luz e voltar a dormir com aqueles bichos repelentes, Ed se encolheu e começou a ruminar sua infelicidade. Seu talento para o desenho e a pintura o alçou por um breve tempo ao estrelato, fez algumas exposições de seu quadros com motivos marítimos em coletivas e individuais que lhe renderam prêmios importantes, medalha de ouro no Salão da Marinha e entrevistas para revistas, jornais e programas locais de televisão. Mas sem dinheiro suficiente para ir para a Europa, onde seria mais bem aceito, foi se desenvolvendo nele uma espécie de aversão à vida. Em sua ânsia de encontrar a alma gêmea, sempre se meteu em relacionamentos com mulheres complicadas, ora independentes e soberbas, ora ciumentas e pegajosas demais, casos que terminavam de maneira melancólica, acentuando sua síndrome de rejeição. A ideia de suicídio sempre o perseguiu como uma sombra nefasta. Frequentemente se imaginava sendo atingido de frente por um ônibus ou um caminhão, mas ele não se via esmagado sob as rodas, antes, jogado longe, chocando seu crânio contra o asfalto, onde ele morreria instantaneamente, tudo se apagaria e o esquecimento e descanso seriam o prêmio por seus esforços infrutíferos. Outras vezes ele se imaginava tendo sua jugular retalhada por uma mulher ensandecida e sangrava até não restar mais nada.
O ramo das ilustrações para livros, revistas e histórias em quadrinhos trouxeram uma fama breve, mas ninguém se alimenta de elogios, menções e apertos de mãos de fãs, a maioria composta de indivíduos esquisitos que só sabiam falar de Tony Stark, Hans Solo, Daeneris, C3PO, Família Soprano, Darth Vader, Coringa, Arlequina, God of War e todas essas coisas mas não tinham tostões no bolso. Aliás, tinham, mas nenhum disposto a pagar uma certa quantia em seu Sketchbook, preferiam, ao invés disso, comprar três gibis encadernados do Homem Aranha.
Houve uma época em que ele conseguia vender seus originais, seus quadrinhos autorais em eventos ao redor do país, mas depois, os antigos foram sendo substituídos por uma geração mais nova, o mercado foi encolhendo, a moda dos grandes festivais foram passando ou dando lugar a um novo tipo de entretenimento, como vídeo games e séries de televisão.
Cansado, Ed se deitou. Não tinha desejo de nada. Aliás, tinha sim, queria morrer, fechar os olhos e não abri-los nunca mais. Mas não queria que fosse naquele quarto fedorento cheio de bichos repulsivos. Com isso em mente, não viu quando Morpheus o abraçou.
O artista, morto de fadiga, não ouviu o dono da farmácia abrir o local. Acordou como que de ressaca, um gosto amargo na boca, dor de cabeça e aquela sensação anormal de bexiga cheia. Levantou-se e deu de cara com o imenso nariz do Milton.
- Salve, seu Ed! Bom dia!
- Ah, bom dia, Milton!
- Servido um café? Tem ali na minha térmica.
- Não obrigado, não gosto de café, me dá azia. Que horas são?
- Quase 10 horas!
- Nossa! Já? Ei, que barulho é esse? Essa movimentação lá fora!?
- Ah, hoje é quinta, dia de feira...até as duas da tarde a rua fica interditada. É bom pra mim, a freguesia aumenta!
- Poxa, que bom! Vou comer um pastel com caldo de cana como desejum. Toda feira tem uma barraca de pasteis.
- Mas a Edilsa vai trazer o almoço as 12 horas!
- Edilsa?!?
- Edilsa é minha mulher.
- Sem problema, eu almoço as 12 horas, sou bom de garfo!
Ed foi ao banheiro e urinou como se não fosse um ato natural. Escovou os dentes, calçou seu tênis, colocou uma camisa e saiu para o burburinho da calçada. Gostava daquela agitação, os pregões dos barraqueiros anunciando seus produtos e suas ofertas fazia-o se sentir anônimo, como se ao se misturar na multidão a depressão e o desespero não pusessem localizá-lo.
Não demorou muito localizou a barraca de pasteis. Comeu dois de palmito e bebeu um belo copo de caldo de cana gelado. O calor estava forte, a sensação térmica era de uns 40 graus, ele calculou. Andando pela massa de pessoas ele viu maracujás doces, difíceis de achar. Eram caros mas ele comprou cinco. Comeu uma suculenta fatia de um abacaxi bem doce. Encaminhou-se para o fim do alvoroço, sabia também que esse tipo de comércio costumavam ter um cara vendendo gibis usados, isso era muito comum nas feiras cariocas. Dito e feito, lá estava um senhor barrigudo, bigodes brancos e fartos pitando um cigarro de palha. Ed sondou o acervo do velho pançudo. Muito Marvel e DC, como sempre.
- Bom dia!
- Dia, moço!
- O senhor teria quadrinhos nacionais?
- Sim, tenho alguns de terror aqui guardados, mas nem exponho pois ninguém se interessa.
Enquanto falava o ancião tirava vários exemplares de uns gibis antigos de dentro de uma caixa de madeira.
Uau! Calafrio, do Zalla, material do Júlio Shimamoto, Flávio Colin, Colonnesse, Rodval Mathias e outros! Ed conteve seu entusiasmo para evitar que o velho cobrasse mais caro pelas revistas.
- Por quanto o senhor vende isso?
- Tenho a muito tempo mas ninguém compra, vendo ao senhor dez reais todo o lote.
- Ok, Fechado! E esses Tex, aí?
- Bem, esses vendem legal, se bem que muitos só querem fazer troca. Eu troco dois por um.
Ed separou algumas unidades com histórias fechadas do cowboy e pagou.
- Esses gibis são para o senhor?
- Sim. Na verdade já criei algumas histórias em quadrinhos.
- Ora, é mesmo? Interessante. Eu tenho um neto que também desenha.
- Verdade? Que idade ele tem?
- Vinte e cinco.
- Ora, eu estava pensando que era um garoto começando a desenhar!
- Nada! Ele faz faculdade de web designer.
- Legal! E ele atua na área?
- Sim, foi estagiário em uma agência de publicidade.
- Foi? Não é mais?
- Ele não gostou.
- Sei como é, também trabalhei por dois anos em uma agência e não tenho boas lembranças.
- Semana passada ele participou de uma seleção para desenhistas de quadrinhos e desenho animado para atuar em uma empresa que está abrindo na cidade.
- Mesmo? O senhor teria como me arrumar o contato desta empresa? É que sou novo na cidade e estou a procura de um emprego e esta poderia ser uma oportunidade.
- Bem, não sei de nada, mas se o senhor vier as 14 horas pode falar com meu neto, ele vem me buscar de carro.
- Ótimo! Venho às 14 horas então. Obrigado!
- De nada.
Ao voltar para a farmácia encontrou Milton conversando com um rapaz com aspecto de anão, devia ter 1,70 de altura, um pouco mais baixo que Ed, mas toda a compleição era de um anão.
- Senhor Palumbo, este é meu sobrinho, Florêncio.
- Opa, como vai Florêncio?
- Bem, e o senhor?
Ed apertou a manzorra um tanto deformada. Um aperto frouxo.
- Tio Milton me contou que o senhor é amigo do Prattes, quem poderia imaginar que ele fosse corno, hein?!? O senhor conheceu a namorada dele? Uma potranca e tanto, mulher de parar o trânsito, meio coroa, mas gostosa pra caralho!
- Não, não conheci, na verdade ele nunca me falou que tinha namorada, se soubesse não teria feito a loucura de vir para cá.
- Sei como é.
- Bem, se me der licença, vou tomar um banho, o calor está de matar!
- Está mesmo, vai nessa.
O desenhista nunca gostou de pessoas que falavam demais. Apressou-se em ir para os fundos. Começou a encher o balde de água e lá veio aquela figura de enorme tronco e pernas curtas.
- Ei, o tio Milton já te falou da gostosa que vem aqui todas as quintas? Ele aplica injeção de anticoncepcional nela. Tem o maior rabo que eu já vi. E ela adora mostrar. Para tomar a injeção basta apenas descer um pouco a calça, mas ela faz questão de descer tudo. Uma bunda enorme e bem feita. Venho todas as quintas só para vê-la.
- É mesmo? Não sabia.
- Sim.
- Bem, eu...
O rapaz aproximou a enorme cabeça comprida como um obus e falou em um sussurro: "sabia que tenho um pau de 25 centímetros? Vou mostrar para ela qualquer hora. Já imaginou minha enorme pica no bundão dela?"
- Olha, Florêncio, né? Dá licença que preciso tomar meu banho.
- Quer ver?
- Ver o quê?
- Meus 25 centímetros?
- Ficou louco, cara?!?
- Ih, foi mal, aí, mas tu falou pra mim que ia tomar banho e tal, achei que cê fosse veado. Ainda mais com esse seu cabelo comprido amarrado atrás....
- Cara, vaza daqui!!!
O anão gigante se afastou constrangido.
Dentro do reservado Ed jogava a água fria com a metade da garrafa de pet sobre a pele bronzeada. Esfregava-se com o sabonete fajuto imaginando assim estar purificando a alma do contato de pessoas como esse tal Florêncio. Quimera!
Milton tinha trazido um travesseiro e lençóis limpos, com a cama devidamente forrada ele deitou-se um pouco. O idiota do sobrinho do farmacêutico, aquelas paredes emboloradas, as baratas à noite, sua condição de vida que nunca mudava de forma significativa geravam uma depressão que o sondava de perto, como uma puta de esquina piscando o olho lascivamente.....todo ganho e pequeno sucesso parecia migalha que ele recolhia do chão. Durante uns anos negros de sua vida ele pensava em como dar cabo dela. Forca? Não! Ele vira um filme quando criança certa vez onde um homem era enforcado, os olhos quase pulando da face, a enorme língua projetando-se boca a fora, o pescoço lacerado e torto. Nunca queria morrer desta forma.
Pular de um prédio bem alto? Ele morria de medo de altura. As vezes pensava, será que a pessoa desmaiava durante a queda? Morria no trajeto ou ficava lúcida vendo o chão se aproximar? Haveria alguma dor ao atingir o solo ou o choque seria tão violento que transformaria o corpo em pasta de forma tão instantânea que nem teria tempo para sentir nada? Bem, ele não queria saber.
Procurou afastar aqueles pensamentos lendo alguns dos gibis que tinha comprado.
Batidas na porta. Era o Milton trazendo um prato de comida que continha arroz, feijão preto, um bife de fígado com cebolas. Ele agradeceu.
- Ei, gibis do Tex! Apontou o baixinho narigudo.
- Cê gosta?
- É a única coisa que leio em quadrinhos. Me empresta?
- Bem, esses eu ainda não li, mas pode levar.
Só, novamente, o desenhista começou comer. Faltava sal, mas melhor que nada. Depois pegou um maracujá, fez um furo no bico e sugou as sementes adocicadas. Aquele sabor trazia memórias da infância sofrida.
Continuou sua leitura. Cochilou um pouco. Tempo depois olhou o relógio e viu que faltavam quinze para as duas, resolveu ir até o velho antes do prazo para garantir que ele ainda estaria lá.
Ao passar pelo quartinho das injeções ele viu uma moça de belas nádegas com o vestido levantado sendo atendida pelo Milton e o idiota do grande anão ao lado observando hipnotizado. Realmente a natureza tinha sido generosa com aquela jovem, uma bunda grande, carnuda, lisa, bem proporcionada à cintura fina e às grossas coxas. Fartos cabelos castanhos claros encobriam-lhe o rosto. Mas isto não importava a Palumbo, o tempo de se interessar por essas coisas tinha passado, não estava morto, mas tudo lhe parecia efêmero, volátil. Ganhou a rua sem pensar o quão abjeto lhe parecia uma garota com a bunda de fora sendo observada por dois marmanjos lúbricos.
As barracas de legumes e frutas eram desmontadas, o refugo oriundo da feira infestava a rua e a calçada, restos e mais restos de pomos e hortaliças atraíam moscas e deixavam no ar um cheiro característico de melancolia.
O velho também guardava seus quadrinhos usados em caixas e os colocava no bagageiro de um carro velho, auxiliado por um rapaz gordo, de óculos, alto, de barba rala e longos cabelos amarrados em rabo de cavalo, assim como Ed. Trajava uma camiseta preta com uma estampa do Batman de Neal Adams e uma calça jeans surrada que parecia querer cair a qualquer momento, um tênis All Star preto concluía a imagem.
- Salve! Vejo que não se esqueceu de vir - saudou o simpático ancião com um sorriso ocultado pelo farto bigode - veio comprar mais alguma coisa?
- Não, já gastei a minha cota por hoje, semana que vem, quem sabe? Rebateu Ed.
- Ei, você não é o Ed Palumbo? Perguntou o rapaz gordo.
- Sim, você me conhece? De onde?
- Ora, eu vi várias entrevistas que você deu nos anos 90 pra algumas tvs locais falando sobre métodos de ilustração, no You Tube e li também seus artigos para uma revista de arte que teve breve circulação. Tenho alguns quadrinhos seus que são verdadeiras relíquias!
Apertaram as mãos. O gordo suava em bicas.
- Poxa, por esta eu não esperava! É bom saber que algumas obras minhas ainda são lembradas.
- Cara, tu é referência pra muita gente, muito conhecido meu na faculdade fez seus TCCs baseado em seus trabalhos.
- Poxa, que bacana!
- E aí, o que você tem feito?
- No momento procuro emprego, e é isto o que me trás aqui. Supondo que você é o neto deste senhor.
- Como assim?
- Mencionei a ele sobre você e a empresa que procurava desenhistas de quadrinhos. Falou o velho.
- Ah, sei. Mas, cara, tu é ídolo de muito carinha que eu conheço, você sumiu, pensávamos que cê tinha ido pra Europa ou pra América onde seu talento seria reconhecido.
- Bem, muita gente pensou isso.
- Você fazia parte de uma revista que vendeu muito, mais do que qualquer uma antes e depois, porque ela acabou tão cedo e repentinamente?
- Bem, digamos que os editores eram idealistas e não eram bons empresários, e um tinha o ego maior que o do outro, dinheiro e sexo corrompem pra valer, pode acreditar.
- Sexo?
- Isso, um dos caras ficou a fim da mulher do outro, mas não quero falar disso.
- Sei...pô mas que merda, não?
- Ô, nem me fale!
- ......
- Mas, voltando sobre a empresa que estava fazendo a seleção, poderia, por favor, me dar o telefone ou o endereço?
- Já fizeram a seleção e já fecharam o quadro, eu nem fui selecionado.
- Poxa, que pena!
- Pois é, só contrataram moleque novo, uma moçada muito boa!
- Bem, mesmo eles já tendo contratado e tal, eu gostaria de tentar um papo com eles, não tenho muitas alternativas, pode acreditar.
- Bem, eu tenho o telefone aqui, mas você vai perder o seu tempo.
Ed viu naquele olhar e tom de voz um certo despeito, uma inveja que já lhe fechou muitas portas, mas insistiu.
- Por favor?
- Bem, ok,
O gordinho tirou uma carteira sebenta do bolso e sacou um cartão amarfanhado.
- Toma, pode ficar, já fizeram a seleção, não vai me adiantar de nada mesmo, e nem pra você, tenho certeza.
- Obrigado! Fico te devendo.
- Ora, cê vai voltar aqui semana que vem pra comprar mais gibis do meu vô?
- Pode ser.
- Se eu trouxer os seus quadrinhos você dedica para mim?
- Claro!
- Faz um sketch massa também?
- Com certeza!
Com um largo sorriso por parte do gordo, Palumbo agradeceu ao neto e ao avô e saiu dali. Foi direto a um orelhão e se frustrou ao ver que não funcionava.
Voltou à farmácia. Vazia, apesar do Milton dizer que em dias de feira tem mais clientes. Ele estava sentado junto ao balcão e lia Tex.
- Milton, eu poderia usar seu telefone por um instante?
- Cara, não leva a mal, mas você paga pelo quartinho e já faço muito, não comece a abusar.
- Ok, desculpe.
O narigudo ainda ia dizer alguma coisa mas Ed deu as costas e voltou para a rua. Havia um mercadinho numa rua paralela. Dirigiu-se até o corredor de produtos de limpeza e encontrou o que procurava, no rótulo dizia: "Mata Baratas!!!! Mata na hora!!! Uma borrifada e continua matando por duas semanas!!!" É isso mesmo que eu quero, pensou. Foi ao caixa. Uma mocinha bonita, magra, de reflexos nos cabelos, lixava as unhas.
- Por favor, vocês colocam créditos no celular?
- Não!
Ed bufou e vociferou:
- Porra, que merda! Ok, tudo bem...
- É ligação local, senhor?
- Sim, claro!
- Então use o telefone que está no balcão, pode pedir ao gerente.
- Obrigado!
Ed ligou para o número que o desenhista gordinho tinha lhe dado. Ocupado. Pediu licença ao simpático gerente do mercadinho e ligou de novo. Atenderam.
- Boa tarde, é a respeito da seleção de desenhistas para sua empresa.
- A seleção já foi feita, o quadro está completo - disse uma apática voz feminina do outro lado.
- Estou sabendo, mas mesmo assim gostaria de falar com o encarregado, mostrar meus trabalhos, talvez ele possa me indicar um outro lugar, sei lá, poderia me por em contato com ele?
- Um minuto, por favor.
- Ok.
Passou-se um tempo.
- Olhe, este tipo de coisa é só com o Adalberto, o dono da empresa e ele está viajando.
- E quando ele volta?
- Um minuto.
Passou-se outro tempo, o simpático gerente agora o olhava de uma forma menos simpática.
A apática voz retornou:
- Pode passar aqui na segunda a tarde, tipo 14 horas?
- Posso sim. Qual o endereço?
Tudo anotado, Palumbo agradeceu ao gerente e a moça do caixa, pagou pelo Mata Baratas e voltou à farmácia sempre vazia.
Milton continuava lendo Tex.
O ilustrador passou por ele sem dizer nada e o outro falou:
- Ei, cara, foi mal o que eu disse sobre o telefone, se quiser pode usar, se for local.
- Ah, tudo bem, valeu! E seguiu para seu quarto.
Borrifou abundantemente o inseticida em cada buraco e fresta na parede, no chão e no ralo do banheiro. Esta noite quero dormir, pensou Ed.
- Ei que cheiro horrível é esse? Veio Milton com a mão na frente do nasal.
Um nariz desse tamanho deve mesmo sentir os aromas com mais intensidade, pensou Palumbo.
- Inseticida para matar baratas.
- Baratas? Mas não há baratas aqui!
- Tá de sacanagem, né? Olha esse entulho que cê acumula aqui nos fundos, olha o ralo do banheiro sempre aberto! E saiba que baratas atraem escorpiões!
- Mas este cheiro vai espantar a freguesia!
- Freguesia? Cai na real, Milton! E o cheiro passa logo.
O outro virou as costas e retornou à sua leitura.
Ed dormiu melhor aquela noite, apesar do calor. Passou a sexta e o sábado no tédio, lendo Tolstói e seus gibis de terror, fez vários esboços em papel sulfite, cochilou muito ao longo dos dois dias e ruminou sua vida precária, principalmente no domingo onde ficou trancado no estabelecimento. Neste dia em específico alimentou-se de frutas e água e distraiu-se brincando com os gatos que ele batizou de a turma do Manda Chuva.
OBRIGADO POR LEREM ATÉ AQUI E AGUARDEM A CONTINUAÇÃO DESTA PARTE DOIS DE TRÊS.
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Muito bacana!!! Já aguardando a próxima parte!!!
ResponderExcluirObrigado pelo comentário, Josean, a continuação pode demorar um pouquinho pois não estou com muito tempo para me dedicar aos projetos pessoais, mas fique atento que a qualquer momento a conclusão chega.
ExcluirAbraço!
MEU VELHO AMIGO LUCA NÃO CONSEGUIU COMENTAR AQUI (NÃO SEI PORQUE ALGUNS TEM ESSA DIFICULDADE) E DEIXOU UM TEXTÃO NO MESSENGER DO FACEBOOK QUE REPRODUZO AQUI, JÁ AGRADECENDO A ELE PELA GENTILEZA DE FALAR A RESPEITO DO CONTO. ISTO ESTIMULA A CONTINUAR. VALEU, MEU VELHO!
ResponderExcluir"Querido velho. Como já disse inúmeras vezes, sua narrativa tem uma riqueza e uma variedade de nuances com enorme poder de atrair quem lê seus escritos! Somente alguém capaz de dominar não apenas os fundamentos da verve, mas também suas várias possibilidades linguísticas consegue evocar a miríade de sensações diferentes como você faz! O primeiro parágrafo que descreve os sentimentos de Ed quando ele está se preparando para começar uma possível nova etapa da vida, mesclado com a descrição do ambiente que o rodeia na cidade de São Paulo possibilita ao leitor ou leitora atentos, vivenciar exatamente o que Palumbo está vivenciando como se de alguma maneira mágica envergássemos a pele do personagem! Suas angústias e seus problemas!
O convite do amigo é como uma luz no fim do túnel para o velho artista! É a tão esperada chance de recomeçar a vida profissional! Assim parece! Muito curiosa a linguagem popularesca do carioca amigo do Palumbo! Uma conversa direta, sem rapapés e salamaleques! Em fim, não há palavras rebuscadas! E isto fala ao coração de Ed! É a tão ansiada tábua de salvação para quem está se afogando na maré da Existência como ele! Esta é, pelo menos, a compreensão que tenho desta passagem!
Pessoas arredias e solitárias como Ed Palumbo quando se veem obrigadas a depender de outrem sentem-se sobremaneira desconfortáveis! É uma situação muito difícil, mas como se pode ver inescapável! Tanto é verdade que Palumbo, ciente de que não poderia perder aquela oportunidade, tratou de tomar as providências para a viagem. Evidentemente, precisava de dinheiro e teve que vender (mal, infelizmente) vários de seus pertences que lhe eram bastante caros (uma questão subjetiva/verdadeira)! Muitas vezes você vende algo por um valor bem inferior ao que você comprou mesmo sabendo que em outras circunstâncias poderia fazê-lo por um valor maior ou talvez mais justo (c’est la vie)! Em fim, o artista teve que partir com o mínimo necessário para ir correr atrás de sua “nova chance de ser feliz!”
Esta narrativa da viagem é uma das partes que mais gosto, pois aqui começa o uso daquela picardia que tanto me agrada em seus escritos e daí em diante me delicio com as descrições detalhadas que me possibilitam visualizar as cenas como se estivesse assistindo a um filme! Eu simplesmente adoro! É um texto politicamente incorreto para os padrões atuais! É ou não é? Vide o diálogo entre Ed e seu alentado companheiro de viagem! É hilário!
O senso comum diz que o brasileiro é por natureza cordial! Certo! Mas não é um padrão o que é muito mais condizente com a realidade! Há pessoas e pessoas! Hee, he, he!
A cena com a “loura do ônibus” é emblemática! Pagou, transou! É cabra macho! Tá sem grana é homo afetivo (usando o politicamente correto, agora)! Puro achismo e despeito da parte da mulher, digo travesti, no caso um homem travestido de mulher! Esta cena hoje geraria polêmica caso caísse em redes sociais? Quien sabe? Tudo é possível!
A cena em que Palumbo urina no sanitário do ônibus, mostra a difícil situação de quem chegado à casa da meia idade, apresenta problemas de bexiga, mas depende da Saúde Pública para um exame e um possível tratamento. É preciso dizer mais?"
E O COMENTÁRIO DO LUCA CONTINUA:
ResponderExcluir"A cena da lanchonete me provocou uma intensa e demorada crise de riso (perversidade da minha parte) e mais uma vez derrubou o senso comum da cordialidade de todo e qualquer brasileiro! Não é que não exista, mas não é um lugar-comum como se pensa!
A cena dos apregoadores de táxi é excelente, pois mostra um episódio comum na saída de rodoviárias e aeroportos, onde os recém-chegados são abordados e quase obrigados a optar por aquele meio de transporte com preços tabelados em guichês nos aeroportos e veículos de taxímetro livre, algo líquido e certo nas rodoviárias em geral! Outro dado bem comum entre nós: Chamar quase todo mundo de “doutor”, uma deferência que alguns até exigem sem o ser de fato! Não é o caso de Palumbo que tratou de se esquivar do assédio e tomar um transporte mais condizente com sua condição financeira (garoto esperto)!
Uau! Que odisseia para chegar ao destino final! E o pior para dar de cara na porta! Sujeito azarado o nosso Ed! Ri muito e gostei da descrição do dono da farmácia! Figuraça! Mas no fim das contas foi a pessoa que estendeu a mão ao desafortunado artista!"
Aquela expectativa de ver o "nossuerói" se lascando mais uma vez, com a sensação de onisciência por saber que ele morrerá de modo tão trágico em um tempo futuro distante uma década, já entrado nos sessenta. Que venha a segunda das três pancadas desse round.
ResponderExcluirObrigado pelo seu gentil comentário, caro amigo. Mas você se surpreenderá - ou talvez nem tanto - com a segunda parte (e capítulo final) da saga do nosso talentoso, porém, desventurado artista.
ExcluirCoitado do Palumbo! Calor, baratas, idiotas... aguardando a parte 2.
ResponderExcluirA parte 2 é o final de tudo. É muito topete meu mas ouso dizer que é uma mistura de John Fante com Fiódor Dostoiévski, evidentemente não o estilo de escrita, mas eu diria nas humilhantes situações em que o protagonista se encontra.
ExcluirObrigado por comentar.